Quando analisei o Dead or Alive 3 mencionei que tinha comprado muito recentemente uma Xbox Series X e como o jogo que vinha de oferta com a consola estava esgotado (entretanto já chegou e já o despachei também visto não ser de todo o meu género) tinha aproveitado então para jogar alguns dos jogos da Xbox original que tenho na colecção e que são retrocompatíveis. Mas no dia seguinte não resisti à ideia de começar a jogar algo desta geração. A Worten perto de minha casa não tinha nada de jeito a não ser o Diablo IV que ainda está bastante caro na minha opinião, pelo que depois de espreitar uma CeX no mesmo centro comercial lá me decidi a trazer este Gollum de lá. Sim, não deixa de ser irónico eu ter-me finalmente estreado na geração actual com um dos piores títulos deste ano, de acordo com a crítica. Mas mesmo sabendo de toda a sua má fama, sendo fã do lore de Tolkien acabei por arriscar. E de facto este Gollum não vai ganhar nenhum prémio de melhor jogo de sempre, mas já joguei muito pior, sinceramente.
O jogo decorre algures entre os eventos do The Hobbit e The Fellowship of the Ring, com o Gollum/Sméagol obcecado em recuperar o anel de Sauron, que lhe havia sido roubado anos antes pelo hobbit Bilbo Baggins. A narrativa começa em in medias res, com Gollum a ser interrogado por Gandalf na cidade élfica de Mirkwood, de onde tinha sido feito prisioneiro. E Gollum começa então a contar a sua aventura que começa uns anos antes nas montanhas de Cirith Ungol, em Mordor, onde este tentava apenas sobreviver. E até que certo dia, depois de uma tentativa infrutífera de recolher comida, Gollum é avistado por um corvo. Suspeitando que o corvo iria revelar a sua localização aos mestres das forças maléficas de Mordor, este persegue-o para o tentar silenciar, acabando no entanto por ser descoberto e feito prisioneiro na torre de Barad-dûr. A primeira metade do jogo é então toda passada em Mordor, com Gollum a ter de fazer toda uma série de tarefas como escravo e a planear o seu escape, para que depois seja feito prisioneiro pelos elfos de Mirkwood onde, apesar de o tratarem melhor, querem na mesma descobrir o que Gollum sabe acerca do anel poderoso.
Este Gollum é então na sua essência um jogo de acção/aventura com bastantes elementos furtivos. Pensem numa espécie de Prince of Persia ou Assassin’s Creed onde teremos de escalar paredes e saltitar entre estruturas frágeis, com os segmentos furtivos de um A Plague Tale, onde nos temos de movimentar pelas sombras ou ervas altas e inclusivamente distrair guardas ao atirar com pedras para objectos metálicos pare que lhes chamem à atenção. No entanto nenhuma das mecânicas de jogo é particularmente excitante. O platforming é na minha opinião o pior pois muitas vezes as coisas saem-nos completamente ao lado, com o Gollum a saltar numa direcção diferente da pretendida, ou falhar totalmente a distância entre plataformas, já para não dizer no quão frustrante foi fazer o Gollum se balancear entre barras. Os segmentos furtivos não são irritantes, são apenas algo básicos e claro, incoerentes. Por exemplo, os orcs que não tiverem equipados com um capacete podem ser assassinados se nos conseguirmos aproximar pelas suas costas sem ser detectados, mas numa das cutscenes finais vemos o Gollum a matar um orc com um capacete como se não fosse nada.

A mecânica realmente interessante que colocaram lida com a dupla personalidade de Gollum/Sméagol. Em certos momentos chave do jogo teremos de tomar uma decisão importante e as personalidades de Gollum e Sméagol têm vontades contrárias. Por exemplo, depois de termos sido apanhados a fazer asneiras, questionam-nos quem foi o nosso cúmplice e o Gollum quer incriminar uma pessoa, enquanto Sméagol outra. Uma vez escolhida a opção que queremos levar avante, somos levados para um diálogo entre Gollum e Sméagol, onde teremos de argumentar a nossa decisão ao escolher uma de várias opções que surgem no ecrã, a fim de convencer o outro a seguir a nossa ideia avante. Se não formos bem sucedidos, é automaticamente executada a outra opção. Infelizmente no entanto, as consequências das nossas escolhas são practicamente inexistentes. Há uma ou outra pequena coisa que muda na história, mas nada de especial. É uma mecânica de jogo interessante, mas que acaba então por ser muito mal aproveitada.

A nível audiovisual/técnico este é outro ponto algo sensível deste jogo. Anunciado em 2019 e com lançamento planeado para 2021, Gollum acabou por ser adiado várias vezes até finalmente ter saído neste ano. No entanto o resultado final chocou toda a gente, não só por existirem graves problemas de performance, bugs e claro, os visuais muito abaixo do esperado. Começando precisamente pelos visuais, o jogo não é lá muito bonito, de facto. Os cenários em si até que escapam, mas as personagens estão muito mal modeladas, especialmente as humanas/humanóides, como é o caso dos elfos ou Gandalf que estão todos horríveis. O próprio Gollum também é feio todos os dias mas isso já é normal na personagem, mas o Gollum deste jogo é especialmente atroz. Acho que é o cabelo estranho (problema que também afecta as outras personagens) que mais borra a pintura. O voice acting achei-o bem competente, sinceramente e a banda sonora é principalmente composta por temas mais discretos ou atmosféricos, o que também não me soaram mal. Agora sinceramente não tive nenhum bug assim tão sinistro que partisse completamente o jogo como muitos se queixaram no início. É certo que os controlos não são os melhores e o platforming é muitas vezes frustrante, mas acreditem que já joguei muito pior. Isto para mim indica que desde a sua janela de lançamento de Maio até agora terão saído alguns patches que tenham melhorado a experiência. O único bug que realmente me irritou tem a ver com esta sequência de falas que surge algures no início do segundo nível, onde depois de sermos feito prisioneiros, teremos de fazer toda uma série de tarefas para os orcs:
Sméagol: What does beasts mean precious, what does it mean?
Gollum: They’ll feed us to some beasts!
Sméagol: But we told him! Sméagol will find it! We swears!
O problema: desde que ouvi esta sequência de frases (ainda bastante cedo no jogo como referi), em 99% das vezes que morri depois disso, e foram inúmeras as vezes em que morri, o jogo passava essas 3 frases novamente ao fazer reload do último checkpoint, mesmo que ficassem sobrepostas com outras frases recentes relativas ao checkpoint em questão. Portanto não foi um bug que me tivesse impedido de continuar a jogar, foi só irritante à brava.

Portanto este Gollum é um jogo mauzinho sim, mas, jogado em Dezembro de 2023 e numa Xbox Series X não tive problemas de maior, pelo que acredito que já tenham corrigido muito do que haveria para corrigir de problemas técnicos. O problema é outro: mesmo que agora afinassem os controlos nos segmentos de platforming e refinassem os gráficos para ficarem qualquer coisa de incrível, Gollum continuaria a ser um jogo mediano. A história é aborrecida durante grande parte do jogo, as tarefas que temos de fazer também o são e o sistema de escolhas Gollum/Sméagol apesar de ser uma boa ideia foi completamente subaproveitado. Infelizmente este fiasco colocou a Daedalic Entertainment em maus lençóis, tendo aparentemente abandonou o ramo de desenvolvimento de videojogos para se dedicar apenas à sua publicação. A Daedalic é autora de inúmeras aventuras gráficas interessantes como a série Deponia, pelo que este desfecho me deixa com algum dissabor.


