Depois da Edia ter lançado a primeira colectânea da série Valis, não perdeu muito tempo a anunciar um segundo volume. Afinal, o primeiro incluía apenas os três primeiros jogos da saga, nas suas versões para PC Engine CD, quando ainda havia uma outra sequela a considerar, bem como variantes para outros sistemas. Este segundo volume inclui o tão aguardado Valis IV, também na sua versão PC Engine CD, Syd of Valis para a Mega Drive, e duas versões distintas do primeiro Valis: a da Mega Drive e a original de MSX, datada de 1986. Tal como acontecera com o volume anterior, a Limited Run Games publicou uma versão física desta colectânea, localizada para inglês, e o meu exemplar deu entrada na colecção algures em Junho do passado ano de 2023.

Tendo em conta que já cá deixei no passado a minha opinião acerca do Valis de Mega Drive e Syd of Valis, este artigo irá focar-se então nos restantes dois títulos presentes nesta compilação. E, para fechar a saga na PC Engine CD, vamos começar pelo Valis IV, lançado originalmente no ano de 1991. E as coisas começam logo com outras protagonistas, visto que Yuko desapareceu após os eventos do jogo antecessor. A personagem principal é mais uma jovem rapariga, agora chamada Lena, que se prepara para lutar, uma vez mais, contra forças demoníacas que anseiam conquistar o mundo. Tal como no Valis III, no entanto, iremos ter outras personagens que se juntam a nós na aventura, a começar por Amu (irmã de Lena) e Asfal (um demónio, e pai do vilão), que também pretende colocar um fim nos planos apocalípticos lançados pelo seu filho.
No que diz respeito à jogabilidade, este continua a ser um jogo de acção 2D sidescroller, herdando os controlos básicos dos lançamentos anteriores, com Lena a manter o mesmo tipo de habilidades de Yuko, nomeadamente o seu slide. Já Amu é a única personagem capaz de executar saltos duplos, enquanto Asfal consegue atravessar certos obstáculos, como espinhos ou barreiras de energia, sem sofrer dano. Para além disso, Asfal, sendo grande e pesado, consegue andar sobre superfícies escorregadias sem qualquer problema. Cada personagem possui uma arma distinta: Lena, tal como Yuko, empunha uma espada capaz de disparar projécteis; Amu ataca com uma espécie de bumerangue; e Asfal utiliza um bastão mágico que dispara cabeças de lobo gigantes, lançadas em arco e que percorrem depois a superfície. São ataques poderosos, embora infelizmente algo inúteis contra alvos aéreos. O facto de as três personagens se jogarem agora de forma bastante distinta obriga-nos a trocar frequentemente entre elas, já que haverá várias secções onde o slide de Lena, o duplo salto de Amu ou a invulnerabilidade de Asfal contra certos obstáculos serão mesmo necessários para progredir. O jogo herda, no entanto, uma mecânica algo aborrecida do seu antecessor directo: sempre que entramos num confronto contra um boss, ficamos presos à personagem que havíamos escolhido imediatamente antes do combate, o que pode ser algo chato.

O sistema de magias foi agora algo simplificado, com cada personagem ter ao seu dispor uma única magia, distinta entre as personagens. A barra de magia é partilhada entre todas as personagens e funciona da seguinte forma: começamos com essa barra parcialmente preenchida e sempre que a utilizamos, ou sofremos dano, a mesma volta a zero. Eventualmente poderemos apanhar power-ups que nos extendam a barra de magia até um nível máximo e quando essa está no máximo, podemos desencadear um poderoso ataque capaz de causar dano em todos os inimigos no ecrã, no entanto, a barra de magia regride e o seu nível máximo volta a ser menor, pelo que deveremos procurar outro desses power-ups para a voltar a expandir. De resto, ao longo da aventura podemos também encontrar outros itens que nos melhorem o poder de ataque das armas, regenerem a nossa barra de vida, vidas extra ou até invencibilidade temporária.

No que diz respeito aos audiovisuais, nota-se que a Telenet Japan e a Laser Soft fizeram um grande esforço em trazer uma apresentação de alta qualidade. Os níveis são longos e variados, levando-nos a diversos tipos de paisagens, como as cidades em ruínas do planeta Terra, cavernas e templos do mundo de Vecanti, entre outros locais mais singulares. As personagens e inimigos sãosprites consideravelmente grandes, bem detalhadas e animadas, e há um esforço notório na apresentação dos níveis, com alguns efeitos de parallax scrolling aqui e ali, relembrando que a PC Engine não suporta nativamente tal efeito, pelo que é sempre um pequeno motivo de celebração quando os vemos. Tal como os restantes títulos da série, este também inclui frequentes cenas animadas num estilo anime, todas todas muito bem detalhadas e com uma narrativa um pouco mais complexa do que nos seus antecessores: a parada nunca esteve tão alta! A acompanhar essas cenas, estão também diálogos com vozes em japonês (traduzidas para legendas nesta versão), e a banda sonora é igualmente bastante agradável, como tem sido habitual. Sendo este um lançamento de PC Engine CD, as músicas estão em formato áudio CD.

Portanto, Valis IV é uma excelente forma de fechar a série Valis, que nunca mais recebeu nenhum outro jogo da sua linha principal. A PC Engine CD ainda recebe, no ano seguinte, uma adaptação do primeiro Valis, já mencionada na colectânea anterior. Existe também uma versão para Super Nintendo deste jogo, que a Edia decidiu incluir numa outra compilação, e que tenciono jogar futuramente.

Falta-me então abordar o Valis de MSX, aquele que supostamente foi o lançamento original de toda a série, lançado algures no final de Novembro de 1986. No mês seguinte, seguiram-se versões para outros computadores nipónicos, como o NEC PC-88, o Sharp X1 e, posteriormente, adaptações para o Fujitsu FM-7 e NEC PC-98. A minha curiosidade em jogar esta versão era bastante elevada, pois sempre me habituei aos Valis de Mega Drive (e mais tarde os de PC Engine), que por sua vez já se apresentavam como experiências mais modernas, tendo em conta o contexto dos anos 90. E de facto, este primeiro Valis é um jogo duro de pegar nos dias de hoje. A nível de mecânicas há diferenças notáveis. Apesar de se tratar igualmente de um sidescroller 2D de acção, foram introduzidos alguns conceitos de RPG. Ao derrotar os inúmeros inimigos, estes largam ocasionalmente esferas coloridas que podem ser recolhidas. Estas servem tanto para restabelecer como para aumentar a nossa barra de vida, que, a cada 100 unidades, recomeça do zero, fazendo-nos subir um nível. Por outro lado, ao sofrermos dano, podemos regredir nos níveis acumulados — e sofrer dano é, infelizmente, demasiado fácil. Os inimigos surgem continuamente no ecrã, e como as suas sprites são bastante simples, é comum que os mesmos (ou os seus projécteis) acabem por passar despercebidos no meio da acção. E depois, este é um daqueles jogos em que a Yuko não tem frames de invencibilidade, recebendo dano de forma contínua enquanto não sair da zona de perigo. Portanto, o primeiro conselho que posso dar é mesmo o de procurar alguns locais mais sossegados do mapa, com menos inimigos, e perder uns valentes minutos a combater para subir de nível, de forma a obtermos uma barra de vida mais robusta. No que toca à jogabilidade, os saltos continuam algo rígidos, e embora a Yuko possua a habilidade de duplo salto, a sua execução deixa bastante a desejar.
No que diz respeito aos restantes itens coleccionáveis, Yuko pode equipar itens ofensivos e defensivos. Os primeiros são upgrades para as suas armas, permitindo-nos começar a disparar projécteis com a sua espada, ou até lançar múltiplos projécteis em simultâneo, por vezes em direcções distintas, consoante o item que coleccionamos. No entanto, equipar estes itens tem um custo, algo que acabamos por descobrir de forma algo acidental. Cada um dos itens ofensivos consome um certo número de níveis, ou pontos de vida, ao ser activado. Ainda assim, a sua utilização é fortemente recomendada, mesmo que depois tenhamos de investir mais algum tempo a voltar a evoluir a personagem. Os itens defensivos, como diferentes armaduras, reduzem a quantidade de dano sofrido por Yuko. Para além disso, existem também outros itens espalhados pelos níveis que nos podem trazer certos benefícios, como objectos que destroem todos os inimigos presentes no ecrã, conferem invencibilidade temporária ou, pelo contrário, funcionam como armadilhas. Há, por exemplo, um item que torna todos os inimigos super poderosos durante algum tempo, sendo por isso algo que devemos evitar a todo o custo.

Passando agora à parte gráfica, devemos primeiro assentar a ideia de que o jogo corre num sistema MSX, cuja tecnologia do início dos anos 80 não suporta, de forma nativa, scrolling, algo amplamente utilizado por jogos de acção que começaram a ganhar popularidade a partir da segunda metade da década. Apesar de se notarem algumas quebras no framerate, esta versão de Valis consegue apresentar um scrolling relativamente convincente, o que é sempre digno de louvor do ponto de vista técnico nesta plataforma. O primeiro nível, com cenários urbanos, está especialmente bem detalhado e colorido, e o mesmo pode ser dito da sprite de Yuko. No entanto, todos os inimigos e respectivos projécteis são renderizados com sprites monocromáticas, que facilmente se confundem com os cenários, sobretudo nos níveis seguintes, cujos visuais já não são tão interessantes como os do primeiro. Para além disso, os níveis são bastante grandes e com um design algo labiríntico, o que se tornou característico em muitos jogos de acção oriundos do mundo dos computadores dos anos 80 e início dos 90, embora essa confusão seja atenuada com uma seta no canto inferior direito do ecrã que indica a direcção da saída. Tudo isto, aliado ao facto de os inimigos serem bastante agressivos e numerosos, torna esta uma experiência particularmente frustrante, onde volto a salientar a necessidade constante de se fazer algum grinding para manter uma barra de vida suficientemente robusta, até porque os bosses também não são fáceis. Já no que diz respeito ao audio, os jogos de MSX apresentam um som muito semelhante ao da Master System, visto que ambos partilham um chip de som parecido. Algumas faixas estão até bastante bem conseguidas tendo em conta o hardware, outras já não tanto. De notar também que esta versão não possui quaisquer cinemáticas, que tornaram a série consideravelmente popular nos lançamentos seguintes.
De resto, em relação à compilação em si, esta traz as mesmas melhorias de qualidade de vida do volume predecessor. Em cada jogo podemos usar save states e um mecanismo de rewind que só peca por nos perguntar constantemente se queremos realmente recuar. Adaptações dos manuais para inglês, seguidas de scans dos originais japoneses e das caixas dos jogos, assim como a banda sonora e todas as cinemáticas presentes nos jogos, podem também ser consultadas. A Edia lançou ainda um terceiro volume desta colectânea, contendo a adaptação de Super Famicom do Valis IV, a versão para Famicom do primeiro Valis e mais algumas edições para computadores nipónicos. Cá estarei para os jogar, algures nas próximas semanas.


























