Discworld Noir (PC)

Finalizando a trilogia de aventuras gráficas baseadas no universo de Discworld, após dois jogos que seguiam as aventuras de um aprendiz a feiticeiro sarcástico, mas incompetente, eis que chegamos ao terceiro e último jogo produzido pelos britânicos da Perfect Entertainment. E, apesar de ser uma aventura gráfica como os restantes, o ambiente desde Discworld Noir é muito diferente, como iremos observar em seguida. O meu exemplar sinceramente já não me recordo quanto custou nem onde foi comprado… sei que foi baratíssimo, vindo de alguma feira de velharias ou loja de produtos em segunda-mão.

Jogo com caixa, muito provavelmente esta edição “Best of” da Infogrames não trazia manual

E esta aventura leva-nos a encarnar num novo protagonista, Lewton, o primeiro e único investigador privado da cidade de Ankh-Morpork. Inicialmente somos visitados por uma mulher misteriosa, Carlotta, que nos oferece uma proposta de trabalho: a de encontrar o seu parceiro Mundy, que havia chegado a Ankh-Morpork a borgo de um navio há meros dias atrás. À medida que vamos investigando, vamos descobrindo uma série de homicídios violentos e sendo envolvidos numa trama conspiratória cada vez mais complexa, o que já dava para adivinhar, após a introdução e cutscene inicial da aventura.

Apesar da atmosfera negra, ao menos o jogo continua com um óptimo sentido de humor

Este Discworld Noir, e o seu novo protagonista, Lewton, marcam então uma grande diferença perante os títulos anteriores. Continua a haver um grande sentido de humor nos diálogos, mas a narrativa é muito mais sinistra, mesmo típica dos filmes “noir” onde os detectives que tipicamente os protagonizam possuem uma moralidade algo ambígua. É o que acontece com o Lewton, que inicialmente era um membro da polícia local, mas viu a sua carreira arruinada e levou com um grande desgosto amoroso em cima, pelo que não é a personagem mais carinhosa do mundo. Mas isto é um Discworld e como referi acima o jogo continua a ter um bom sentido de humor nos seus diálogos, com Lewton a ser especialmente sarcástico e corrosivo. Enquanto Rincewind era também sarcástico, mas com uma personalidade um pouco incompetente e trapalhão, Lewton é bem mais perspicaz nos seus diálogos.

A navegação pelos diferentes cenários é agora mais simples. As localizações que desbloqueamos aparecem de forma bem saliente no mapa

As mecânicas de jogo são as típicas de uma aventura gráfica point and click onde teremos de explorar vários cenários e falar com muitas pessoas. O rato permite-nos não só movimentar pelos cenários, bem como observar/comentar sobre algum objecto ou pessoa, ou interagir/falar com os mesmos mediante o botão utilizado. Para além de um inventário, onde iremos uma vez mais recolher alguns itens necessários para resolver alguns puzzles, Lewton também vai apontando uma série de pistas num bloco de notas, algo que teremos de usar bastante quando dialogamos com outras pessoas. Há é uma menor variedade de cenários a explorar, nunca saímos da cidade de Ankh-Morpork. No entanto, a exploração não é tão complicada quanto no primeiro Discworld, pois as localizações que vamos tendo acesso são assinaladas de forma saliente no mapa da cidade.

Como um bom detective, Lewton vai apontando uma série de pistas no seu bloco de notas, que poderão posteriormente ser usadas nos diálogos com as diversas personagens

A nível gráfico leva-nos a abordar a outra maior mudança perante os primeiros dois jogos. A primeira é a atmosfera. Sendo esta uma aventura noir, toda a acção vai-se passar à noite, pelo que contem sempre com cenários escuros. E convém afirmar que apesar do Lewton ter uma estética muito próxima de um detective dos anos 40, com a sua gabardine e chapéu icónico, toda a narrativa decorre igualmente num mundo de fantasia medieval, o que não deixa de ser um contraste interessante. Já a nível gráfico em si há também algumas mudanças consideráveis. O primeiro Discworld possuía gráficos 2D bem coloridos e com uma pixel art muito detalhada. O segundo jogo eleva os gráficos para um nível de detalhe quase vindo de um filme de animação e, embora eu sinceramente prefira os visuais mais pixel art, não deixa de ter sido um bom trabalho. Este terceiro jogo, lançado em 1999, já sai numa altura onde a indústra quase que obrigava que tudo tinha de ser em 3D ou algo parecido. Pois bem, contem então com cenários totalmente pré-renderizados, onde a única personagem verdadeiramente tridimensional é o próprio Lewton. Mesmo outras personagens ou objectos com os quais interagimos são pré-renderizados e com animações muito rudimentares, o que acaba por não envelhecer tão bem.

Infelizmente os cenários exageradamente escuros e em baixa resoluão não envelheceram bem

E isto leva-nos a outro problema pois ao usar gráficos pré-renderizados a resolução no PC fica travada a 640×480. É um jogo que não corre nativamente em sistemas operativos modernos como o Windows 10, e embora exista um patch feito por fãs para o tornar compatível, esperem por alguns problemas técnicos na mesma. Ora o grafismo pré-renderizado de baixa resolução, aliado a uma atmosfera negra onde todos os cenários são bastante escuros, acaba por tornar este Discworld Noir um jogo que não envelheceu tão bem quanto os seus predecessores. De resto a nível de som continua a ser uma obra excelente. O voice acting oscila entre o excelente e algumas personagens (creio que propositadamente) mais irritantes. O humor está sempre lá e a própria banda sonora, tal como nos filmes noir, vai buscar muitas influências a temas jazz mais soturnos e deprimentes.

Portanto este Discworld Noir é mais uma óptima aventura gráfica, repleta de bom humor. É no entanto um jogo muito diferente dos seus predecessores, não só pela sua atmosfera bem mais negra e um protagonista corrosivo, pois afinal é uma aventura noir. E tal como referi acima, o facto de ser um jogo onde toda a acção decorre à noite, aliado ao facto de os cenários e personagens serem agora prérenderizados, trancados a uma resolução baixa, acaba por não envelhecer tão bem do ponto de vista visual, o que é uma grande pena, pois a narrativa até que continua a ser muito boa e repleta de bom humor.

Discworld II (Sony Playstation)

Adorei o primeiro Discworld, apesar de ter puzzles ridiculamente complicados, mas o seu fantástico sentido de humor, bom voice acting e cenários muito bem detalhados faziam esquecer tudo o resto. Portanto as expectativas eram elevadas para a sua sequela que acabou por sair em 1996/1997 dependendo da plataforma e região. O meu exemplar é o da Playstation 1, que foi comprado numa feira de velharias algures em Julho de 2018 por 5€, mas acabei antes por jogar a versão PC que é compatível com o ScummVM, por razões que detalharei mais à frente.

Jogo com caixa e manual

Este é, tal como o seu predecessor, uma aventura gráfica em 2D do estilo point and click, colocando-nos uma vez mais no papel do aprendiz a feiticeiro Rincewind, que continua a não ter jeito nenhum para magia, mas o seu sarcasmo está ainda mais aguçado. A história anda à volta da própria Morte que se farta da sua profissão e decide tirar umas férias prolongadas, causando que ninguém consiga efectivamente morrer. A imortalidade acaba no entanto por não ser uma coisa boa, pois quem estaria para morrer torna-se num zombie ou num fantasma, o que acaba por causar alguns problemas lá na cidade de Ankh-Morpork. Inevitavelmente cabe-nos a nós resolver essa situação e, tal como o próprio Rincewind muitas vezes vai comentar, lá teremos de participar numa série de fetch quests ridículas para resolver o problema.

Já tada a gente sabe o que vamos ter de fazer àquela “Marylin Monroe” ali

No que diz respeito à jogabilidade contem com o habitual dentro do género. A versão PS1 até suporta o rato, acessório que não tenho, tendo essa sido uma das razões que me tenha levado a jogar antes a versão PC. Todas as acções podem no entanto ser realizadas com o comando normal da Playstation, com os direccionais a mover o cursor e os botões quadrado, triângulo e círculo a servirem para nos deslocarmos para a posição do cursor, interagir com o objecto apontado pelo cursor, ou comentar sobre os mesmos, respectivamente. Tal como no primeiro jogo existem dois inventários, o principal é um baú com pernas que nos segue constantemente, mas Rincewind também possui um inventário limitado a 2 itens, que teremos de usar habilmente para resolver alguns puzzles em locais onde o baú não nos consegue perseguir. Para quem estiver a jogar com o comando da PS1, poderá usar os botões L1 e R1 para abrir estes inventários mais rapidamente, no entanto.

Eventualmente vamos ter acesso a outras localidades para além da capital

O primeiro Discworld era um jogo extremamente frustrante pelo facto de termos de falar várias vezes com as mesmas personagens, ou entrar várias vezes nos mesmos cenários para que certos eventos pudessem acontecer. E isto aliado ao mapa da cidade ser enorme e de difícil navegação, bem como as soluções dos próprios puzzles serem muito rebuscadas, tornaram o primeiro jogo muito difícil para quem não usasse um guia. Aqui vamos ter na mesma alguns puzzles rebuscados, mas os cenários estão mais espaçados entre si, tornando a sua identificação e navegação mais óbvia e os diálogos que vamos tendo, bem como as respostas que o Rincewind nos dá quando tentamos combinar itens no inventário, acabam por ser mais elucidativos também. Para além da Unseen University e várias localizações da cidade de Ankh-Morpork, vamos poder também explorar outras áreas de jogo como a cidade de Djelibeybi, claramente influenciada pelo Egipto, o centro cinematográfico de Holy Wood, entre outros locais que prefiro não spoilar. A narrativa é sempre bastante interessante, com muito humor e sarcasmo à mistura. O próprio Rincewind farta-se de queixar que está farto de quests estúpidas e para procurar por itens bizarros para soluções mirabolantes, mas a verdade é que acabamos por ter de as fazer na mesma. Tal como o primeiro, o este está dividido em vários actos mas os últimos (e o próprio epílogo) são mais curtos e algo desinspirados comparando com os primeiros, o que me leva a crer que o desenvolvimento do jogo teve de ser algo apressado.

Uma vez mais o sarcasmo e o bom sentido de humor estão sempre presentes. A anã fêmea foi hilariante!

Graficamente estamos perante um jogo muito bem feito. Eu adorei o primeiro Discworld por possuir cenários muito bem detalhados, assim como as personagens que também tinham boas animações, e tudo isto com um pixel art bastante interessante. Com a sequela, a Perfect Entertainment decidiu “melhorar” as coisas ao apresentar cenários ainda bem mais detalhados com qualidade muito próxima a desenhos animados que poderíamos ver na televisão. Sinceramente eu prefiro o pixel art, mas entendo perfeitamente a decisão em optar por estes visuais mais trabalhados. Enquanto no primeiro Discworld a versão PC, PS1 e Saturn eram practicamente idênticas nos visuais, nesta sequela isso já não é verdade. A versão PC corre numa resolução superior e vem em 2 CDs, ao contrário das versões Saturn e PS1. Portanto a versão PC acaba por ter gráficos mais detalhados no geral e cutscenes menos comprimidas, tendo sido essa a outra razão pela qual decidi optar antes por jogar a versão PC. De resto a nível de audio, contem uma vez mais com um voice acting de luxo, repleto de diálogos sempre bem humorados ou sarcásticos. Tal como no primeiro jogo, existem no entanto personagens mais carismáticas que outras, ou personagens onde o seu voice acting acaba por resultar melhor. Mas é um excelente trabalho uma vez mais.

A versão PC corre numa maior resolução e com gráficos mais bem detalhados, tendo sido essa a versão que optei por jogar.

Portanto este Discworld II é mais um excelente jogo de aventura gráfica, repleto de um óptimo sentido de humor e muito sarcasmo como eu bem gosto. Visualmente é também um jogo mais elaborado, embora como tenha referido há pouco prefiro o estilo mais pixel art do primeiro jogo. Continua no entanto absolutamente recomendado e foi mais um título que me deixou cheio de vontade de ler os livros do Terry Pratchet. A série Discworld, no que diz respeito aos videojogos não se ficou por aqui, com o lançamento do Discworld Noir a levar a série noutra direcção. Irei jogar esse em breve e veremos!

Discworld (Sega Saturn)

Sempre ouvi falar maravilhas dos jogos Discworld, principalmente por todo o excelente humor que os acompanham. E de facto, após finalmente ter jogado este primeiro Discworld, percebo perfeitamente o porquê de ser um jogo muito acarinhado pelos fãs das aventuras point and click. O meu exemplar para a Sega Saturn foi comprado a um amigo algures em Outubro de 2018, mas sinceramente já não me recordo quando terá custado. E só para que seja claro, apesar deste artigo ter como destaque a versão Sega Saturn, eu joguei apenas pouco mais de uma hora dessa versão, tendo transitado posteriormente para a versão PC, pela comodidade de usar um rato! Mas, pelo que joguei da versão Saturn, esta fica muito próxima da versão PC, conforme irei descrever mais tarde.

Jogo com caixa

Ora antes dos videojogos Discworld, haviam também uma já longa série de livros escritos por Terry Pratchett, todos repletos de bom humor, e todos assentes no universo de Discworld. E esse é um mundo fantasioso que irá agradar a todos os entusiastas da terra plana, pois aquele planeta é literalmente um disco, sustentado por 4 elefantes gigantes, que por sua vez são sustentados por uma tartaruga gigante que vagueia pelo espaço. Nós aqui encarnamos no jovem (e algo inútil) Rincewind, um aprendiz a feiticeiro da Unseen University, cidade de Ankh-Morpok. O problema a resolver é simples: um culto sinistro invocou um dragão para destruir a cidade e, principalmente, o seu ditador e por força das circunstâncias acabaremos por ter de ser nós a resolver toda essa confusão e, de alguma forma, derrotar o dragão.

Nos diálogos temos diversas opções para tomar, umas mais cómicas que outras

No que diz respeito às mecânicas de jogo, estas até que são bastante simples, onde com o ponteiro do “rato” a servir para todo o tipo de acções: mover, falar, interagir, observar, etc. Tudo dependerá do contexto! Teremos também 2 inventários a ter em conta, o pessoal, que permite carregar com 4 itens ou habilidades, e um inventário maior, que é nada mais nada menos do que uma espécie de animal de estimação de Rinceweed, um baú vivo com 8 patas e que nos segue para todo o lado. No caso da Sega Saturn, infelizmente esta versão não suporta o rato (até porque esse periférico acabou por não ser lançado na Europa), pelo que teremos de usar o d-pad para mover o ponteiro pelo ecrã. E isto pode irritar um pouco, porque o ponteiro mexe-se muito lentamente, mas enquanto mantivermos o direccional pressionado na mesma direcção, o ponteiro vai acelerando o seu movimento. Creio que acaba por ser uma questão de hábito, mas essa foi a principal razão que me levou a optar por jogar a versão PC em seguida. É que apesar dos controlos serem tecnicamente simples, o jogo em si é bastante difícil. Isto porque teremos uma imensidão de locais a explorar, personagens para falar, dezenas de objectos para coleccionar, combinar e usar… Para progredir, teremos de explorar os mesmos cenários vezes sem conta, a ver se descobrimos algo novo que possa ser interagido, ou algum diálogo novo com alguma personagem que até já possamos ter interagido antes. E tendo em conta que temos um mapa gigante da cidade para explorar, com certas localidades a serem desbloqueadas à medida que a história vai avançando… é algo que nos vai dar trabalho.

Os detalhes de quando entra o “explicador” estão deliciosos!

E os “puzzles” que temos de resolver para progedir no jogo também não costumam ser nada óbvios. São hilariantes sem dúvida, mas muito dificilmente chegaria à sua solução sozinho. Por exemplo, a certa altura temo-nos de nos infiltrar na tal sociedade secreta que invocou o dragão e para isso precisamos de umas vestimentas negras. Ora numa esquina está um monge de uma outra religião sinistra, também com vestes negras. Como conseguimos obter essas roupas? Muito simples, temos de apanhar uma borboleta (e para apanhar essa borboleta já foi um filme…), depois viajar no tempo até 12h no passado, colocar a borboleta a voar ao pé um poste para que no presente seja criada uma nuvem que chove precisamente em cima do tal monge. Depois é voltar ao presente, e pegar nas suas roupas que estavam a secar num estendal lá perto. Epá, eu entendo perfeitamente a referência do efeito borboleta, mas acho que não chegava a essa solução sozinho. E exemplos como este, existem muitos, alguns ainda mais rebuscados.

Já a nível audiovisual é, de facto, um jogo excelente, a começar pelo voice acting que é variado, de qualidade, e repleto de bom humor. Aliás, toda a narrativa é muito bem humorada e o jogo está repleto de pormenores muito interessantes, como os inúmeros trocadilhos que vão sendo feitos, os diálogos com a Morte, que surge sempre que Rinceweed faz alguma coisa extremamente perigosa, ou mesmo aqueles interlúdios onde aparece no ecrã um comentador (parecido àqueles dos programas de vida selvagem), explicando algum conceito do mundo de Discworld. Graficamente é um jogo com cenários muito bem detalhados e personagens também com um aspecto muito cartoon e também muito pixel art ainda. A versão Saturn, do que joguei, está idêntica, senão muito próxima, à versão de PC, o que é uma óptima notícia. As músicas são todas em MIDI, tal como na versão PC, mas de certa forma compreende-se, caso contrário não haveria espaço para todos os diálogos que, uma vez mais digo, são absolutamente hilariantes e, para mim, a principal razão para se jogar este Discworld.

Graficamente é um jogo interessante, misturando os cenários muito bem desenhados com personagens ainda com muito pixel art

Portanto este Discworld é para mim um jogo absolutamente recomendado, por todo o bom humor e atenção ao detalhe que possui. É no entanto um jogo bastante complexo no seu progresso, pelo que não se inibam se tiverem de usar um guia, pois tal como referi acima, existem inúmeros locais para explorar, cujos até vão tendo pessoas e/ou objectos diferentes para interagir mediante a altura em que os visitamos. E com as dezenas de objectos que vamos acabar por carregar, descobrir as soluções sozinho irá dar um trabalhão gigante de exploração e tentativa/erro. Pessoalmente até fiquei interessado em ler os livros!