No More Heroes 2 (Nintendo Wii)

De volta à Nintendo Wii para mais um título da autoria de Goichi Suda e do seu estúdio Grasshopper Manufacture, preparem-se para uma aventura repleta de acção, humor e momentos bizarros. Já cá trouxe no passado a versão PS3 do seu predecessor e, apesar de algumas falhas notórias na jogabilidade e de certas decisões de design questionáveis, a verdade é que todo o seu humor e momentos de pura bizarrice fizeram esquecer tudo o resto. O segundo jogo permaneceu exclusivo da Wii durante muitos anos, tendo sido relançado para a Nintendo Switch (e posteriormente para outros sistemas) a partir de 2020. O meu exemplar foi comprado algures em 2014, na saudosa New Game do Maiashopping, por menos de seis euros.

Jogo com caixa e manual

O jogo coloca-nos novamente no papel de Travis Touchdown, um assassino que havia regressado à sua vida normal após os acontecimentos narrados no primeiro título. No entanto, alguém mata o seu melhor amigo e Travis, sedento de vingança, volta a juntar-se à United Assassin’s Association, já que o responsável por tal ultraje é nada mais nada menos do que o assassino que ocupa a posição número um do ranking actual. Desta vez, porém, para chegarmos ao topo teremos de eliminar cerca de cinquenta outros assassinos acima da nossa posição. Certas personagens do primeiro jogo, como a sedutora Sylvia, marcam também o seu regresso e, tal como o seu predecessor, No More Heroes 2 é ultra-violento e profundamente bizarro.

O combate permanece intenso e ultra violento!

As mecânicas de combate são similares às do primeiro No More Heroes, com Travis munido de um sabre de luz que permite desferir golpes horizontais, verticais, bem como socos e pontapés. O uso do sabre (que pode também ser utilizado para deflectir projécteis inimigos) consome energia das suas baterias, que podem ser recarregadas manualmente ao abanar a arma de uma forma muito peculiar. Travis tem igualmente um fascínio pelo wrestling, e quando conseguimos atordoar os inimigos podemos executar toda uma série de suplex, que servem como finalizações particularmente brutais. Por fim, existe uma barra de “êxtase” que vai enchendo à medida que distribuímos pancada e, quando atinge o máximo, podemos activar o Dark Side Mode, onde, de forma temporária, o mundo abranda e os nossos golpes tornam-se devastadores. Sempre que finalizamos um oponente vemos também um mecanismo de slot machine a rodar e, caso surjam três símbolos iguais, é activado um power-up específico, normalmente de efeitos destrutivos. Uma pequena diferença nesta sequela é o facto de Travis poder alternar rapidamente entre diferentes sabres de luz desbloqueados, através do botão direccional.

Os quick time events, se jogado com um classic controller, requerem o uso dos dois analógicos e são simples de concluir com sucesso.

A grande diferença desta sequela em relação ao original está no que fazemos entre as missões principais. No primeiro jogo, a cidade de Santa Destroy podia ser explorada livremente: era possível visitar lojas para comprar novo equipamento, realizar trabalhos temporários ou missões secundárias para ganhar algum dinheiro extra, e ainda visitar o dojo para treinar e melhorar a condição física. No entanto, o mundo aberto era deserto, a exploração aborrecida e conduzir a moto tinha controlos muito pouco práticos. Aqui, todo esse conteúdo opcional mantém-se, mas foi consideravelmente simplificado: todos os pontos de interesse estão agora representados como ícones num mapa, permitindo-nos aceder directamente a cada local. Já não é necessário, por exemplo, ir primeiro ao centro de emprego e depois à localização do empregador: tudo é mais directo, o que é uma melhoria significativa.

Nem sempre jogamos com o Travis e os fãs do primeiro jogo vão ficar contentes de saberem quais são as outras personagens jogáveis.

Os mini-jogos dos trabalhos temporários são tão bizarros quanto variados nas suas mecânicas, e adoptam agora um estilo visual de 8 bits, tanto nos gráficos e som como nos ecrãs de título e menus, que evocam a era inicial da Famicom / NES. Há de tudo um pouco: acção (como exterminar insectos), corridas (entrega de pizzas), puzzles, entre outros. A única excepção é o último emprego desbloqueado, “apanhar escorpiões”, que se mantém semelhante ao original. O ginásio (com um personal trainer muito sui generis) apresenta também dois mini-jogos neste estilo retro. O primeiro No More Heroes já tinha muitas referências a videojogos antigos e isso mantém-se, até porque há ainda mais conteúdo opcional no apartamento de Travis, incluindo um shmup jogável na sua consola.

E porque não também um combate com robots gigantes? Aqui temos de ser bastante reactivos às acções do nosso oponente

Outra novidade interessante é a presença de outras personagens jogáveis, embora utilizadas apenas em algumas missões. Ambas foram introduzidas no primeiro jogo: a jovem Shinobu, única capaz de saltar, protagoniza níveis com algum platforming (infelizmente, de qualidade duvidosa), enquanto Henry é uma personagem bastante ágil cuja habilidade especial é correr a grande velocidade. Há ainda uma secção em que controlamos um robot gigante ao estilo Power Rangers, e outras em que conduzimos a moto de Travis se bem que estas últimas, curiosamente, menos interessantes do que as do jogo anterior.

Os mini-jogos são também apresentados num estilo retro e são tão variados como bizarros!

Devo referir ainda que, apesar de No More Heroes 2 ter sido desenvolvido a pensar nos sensores de movimento do Wiimote e Nunchuck, há que dar mérito à Grasshopper por ter incluído suporte ao Classic Controller, que foi o modo como joguei. Sinceramente, achei que funcionava bastante bem: os botões faciais servem para golpes horizontais, verticais, socos e pontapés; o botão L faz lock-on no inimigo mais próximo (e bloqueia, caso não ataquemos); o R serve para recarregar a katana; o botão “–” activa o Dark Side Mode, enquanto o “+” pausa o jogo. Em suma, os controlos funcionam bem, embora tenhamos que aprender bem os timings dos nossos combos para ter mais sucesso. Apenas os saltos da Shinobu me causaram algumas dores de cabeça.

A Sylvie está também de volta com novas jiggle physics exageradas.

No que toca aos gráficos, o jogo utiliza a mesma técnica de cel-shading para representar personagens e cenários, conferindo-lhe um aspecto algo cartoon, mas tal como na prequela (e, de certa forma, também em Killer 7), a direcção artística mantém-se muito própria e coerente. É um videojogo de estética urbana e moderna, extremamente violento e repleto de referências de cariz sexual. A banda sonora é igualmente agradável, alternando entre temas rock para os momentos de maior intensidade e faixas jazz ou electrónicas para outras ocasiões. Os mini jogos em estilo 8 bits apresentam melodias chiptune muito bem conseguidas. O voice acting é competente, com o mesmo actor a regressar como voz de Travis na versão inglesa, e a narrativa mantém-se hilariante com uma narração bem conseguida no geral.

Em suma, apesar de No More Heroes 2 ter ainda algumas arestas por limar na jogabilidade (algo já característico dos jogos da Grasshopper), gostei bastante da experiência. Depois deste lançamento (que coincide temporalmente com a versão PS3 do primeiro jogo), a série entrou num hiato, sendo ressuscitada apenas em 2019 com Travis Strikes Back, os relançamentos dos dois primeiros títulos e uma nova sequela. Seguramente irei jogá-los em breve!

No More Heroes: Heroes’ Paradise (Sony Playstation 3)

Lançado originalmente para a Nintendo Wii, No More Heroes é um jogo de acção bastante peculiar e bizarro também, como tem sido habitual em practicamente tudo o que o Goichi Suda trabalha (quando tem liberdade criativa para tal). É mais um jogo com uma temática à volta de assassinos, embora muito diferente a nível de jogabilidade (e narrativa) do Killer 7, do qual eu sempre achei que este jogo seria uma espécie de sucessor. Entretanto, alguns anos após o lançamento da versão original da Wii, eis que é lançada uma conversão para a Playstation 3 com algum conteúdo extra, conversão essa que chega ao nosso mercado algures em 2011, já depois da sua sequela ter sido lançada na Wii. O meu exemplar foi comprado numa Game, algures em Janeiro de 2013 por uns 15€.

Jogo com caixa, manual e papelada.

Como devem imaginar, a história é bastante bizarra, mas fiquemo-nos pelo básico: Nós controlamos o jovem Travis Touchdown que esbanja todo o seu dinheiro em videojogos e outros coleccionáveis, tendo o último sido um sabre de luz que o deixou falido. Então decide aceitar a proposta da sedutora Sylvia Christel e assassinar alguém, sendo recompensado por isso. Após essa missão bem sucedida, somos informados que ficamos no 11º primeiro lugar do ranking da United Assassins Association e como uma coisa leva à outra (para além de certos incentivos da própria Sylvia), lá vamos querer matar todos os restantes assassinos para chegar ao topo do ranking.

O objectivo do jogo é chegar ao número 1 da tabela dos assassinos, pelo que teremos de derrotar os restantes.

O jogo foi lançado originalmente para a Nintendo Wii e como a arma do protagonista é uma espada, certamente já estão a antever o que isso representa: motion controls! Essa foi a principal razão pela qual preferi antes jogar este nova versão da PS3 (isso e o facto de ter também alguns extras ou outras melhorias), pelo que os controlos aqui são mais convencionais, embora o jogo também suporte o move, para quem preferir. Os botões faciais servem desferir golpes horizontais ou verticais, bem como distribuir socos e pontapés, que por sua vez poderão quebrar defesas e/ou deixar os inimigos atordoados. Sempre que isso acontece, poderemos pressionar o botão R2 para os agarrar e cumprir alguns quick time events com os analógicos para fazer um de vários suplex e os atirar ao chão. O botão L2 é o botão de lock, permitindo-nos focar num inimigo de cada vez, e esta postura também nos permite defender de golpes/balas inimigas automaticamente. O analógico direito serve também para nos desviarmos, enquanto o L1 é usado para consultar o mapa. Existe muito mais a ter em conta em relação ao combate, como os diferentes bónus que poderemos vencer cada vez que executamos um inimigo de forma violenta, a possibilidade de usar charged attacks, ou os dodge avançados que nos colocam nas costas do inimigo. Mas o mais importante mesmo é o facto da nossa espada perder energia com o seu uso, pelo que ocasionalmente a temos de recarregar. Na Wii tínhamos de abanar o wiimote na vertical (com o movimento a ser replicado pelo Travis no ecrã de uma maneira muito cómica), aqui precisamos de pressionar R1 e uma vez mais abanar o comando. É o único controlo de movimento necessário mesmo se usarmos um dualshock normal e entendo perfeitamente o porquê de o terem incluído. A animação continua bastante cómica! No entanto este conceito da espada precisar de ser recarregada pode-nos causar alguns problemas, particularmente na primeira metade do jogo, pois podemos ficar algo indefesos no meio de algum combate mais exigente.

Sim, o jogo suporta o move. Mas mesmo sem controlos por movimento, a acção de recarregar a espada é a única que nos obriga a abanar o comando

Mas No More Heroes é mais do que um jogo com um sistema de combate interessante e ultraviolento, pois fora das suas missões principais, o jogo tem muito mais para oferecer ao permitir-nos explorar livremente uma cidade com alguns pontos de interesse. Cada missão principal obriga-nos a pagar uma taxa de entrada e como o Travis é pobre, teremos de arranjar alguns empregos em part time. O primeiro emprego que arranjamos consiste em apanhar uns quantos cocos e à medida que vamos avançando na história poderemos participar em várias outras tarefas como cortar relva, apanhar lixo da rua, servir de sinaleiro para barcos no oceano, entre muitos outros empregos estranhos. Atingir uma medalha de prata ou ouro nesses eventos permite-nos desbloquear missões especiais, essas já com combate e objectivos variados (assassinar alguém em específico, matar X pessoas dentro de um tempo limite, etc) sendo que essas missões em particular já nos recompensam com bem mais dinheiro. Eventualmente desbloqueamos também as Free Missions, que nos obrigam a matar todos os inimigos num local, com a penalização de termos apenas um ponto de vida, pelo que ao mínimo de dano sofrido perdemos a missão. O dinheiro que vamos ganhando pode ser também gasto em comprar novas espadas e upgrades (altamente recomendável), treinar no ginásio (também recomendável), ou comprar novas peças de roupa. Para além de tudo isto, temos também uns quantos coleccionáveis para apanhar, mas apenas as bolas Lovikov valem realmente a pena, pois estas servem para nos desbloquear algumas habilidades que se tornam bastante úteis, incluindo a habilidade de correr na cidade.

Em missões como esta que estejam carregadas de inimigos, a performance detiora-se severamente

No entanto, apesar de tanta coisa para fazer, explorar o mundo de No More Heroes é simplesmente aborrecido, pois a cidade está practicamente vazia e é simplesmente desinteressante. Para além disso, não existem grandes possibilidades de fast travelling. Quando queremos trabalhar, o fluxo é o de ir primeiro ao centro de emprego, escolher o trabalho e depois lá temos de viajar até ao local do mesmo. No fim do mini-jogo, se o quisermos jogar novamente para ganhar mais dinheiro não o podemos repetir directamente, obrigando-nos a voltar ao centro de emprego e repetir o processo. Ao menos se seleccionarmos um trabalho que já tenhamos feito antes, aí sim, temos a possibilidade de fazer fast travel para o seu local, o que é uma das novidades desta versão perante o lançamento original. Mas seria muito mais proveitoso se, uma vez aceite um emprego pela primeira vez e viajar até ao seu local, o mesmo ficasse disponível para sempre nesse local do mapa. Reduziria muito tempo desnecessário em viagens numa cidade vazia e aborrecida. As missões especiais seguem o mesmo fluxo também, obrigando-nos primeiro ir a um “centro de emprego” específico para tal. Todavia, para nos ajudar a não morrer de tédio em todo este processo, temos também uma moto à nossa disposição que nos permite deslocar mais rapidamente pelo mapa. O problema é que a moto controla-se de uma forma horrível e se caso pressionarem para cima no analógico esquerdo a mesma salta, o que pode resultar num acidente se colidirmos contra algum edifício ou veículo, e isto é algo que irá acontecer muitas vezes de forma acidental. Eventualmente lá nos habituamos a estas peculiaridades mas há outro problema grave com a moto: esta tem a tendência para ficar presa em postes ou troncos de árvores, o que é um bug muito chato.

Bowling humano enquanto os atropelamos com a nossa moto? Sim, é só mais um part-time em No More Heroes

Visualmente este é um jogo bastante interessante particularmente pelo design das personagens e o interior de certos edifícios, onde em ambos os casos há uma notória influência de filmes e actores mais conhecidos. As personagens são renderizadas num estilo muito próprio e que se assemelha a um cel-shading, mas infelizmente, como já referi acima, a cidade onde o jogo se desenrola é bastante simples e aborrecida. Já num jogo de Wii não seria nada do outro mundo, agora imaginem num jogo de PS3. E infelizmente também, mesmo este jogo correndo numa PS3, o mesmo contém graves problemas de performance, com quebras abruptas e prolongadas de frames a ocorrerem nos momentos onde temos muitos inimigos no ecrã em simultâneo, o que vai acontecer em certas missões. Mas tudo isto é desculpável pelas personagens interessantes e todas as situações de bom humor que o jogo nos vai proporcionando ao longo da aventura. Para terem uma ideia, para gravar o progresso do jogo temos de visitar uma retrete, com o Travis a abaixar as calças e sentar-se numa sanita. De resto, o voice acting achei-o bastante bom, e mesmo não havendo a opção de ouvir o original japonês nesta versão, o que tivemos direito é bastante convincente. A banda sonora foca-se principalmente em músicas mais rock, o que se adequa perfeitamente ao jogo em si.

Se formos eficientes nos empregos, desbloqueamos missões de assassinato e essas sim, dão dinheiro a sério e podem ser rejogadas sempre que quisermos.

De resto, o que traz mais esta versão PS3? Para além de pequenas melhorias de qualidade de vida ao incluírem um sistema de fast travel que só peca por ser rudimentar e ter sido implementado apenas a 30% do desejável, esta versão possui alguns bosses do No More Heroes 2, sendo combatidos em certos momentos da narrativa principal. Também incluíram várias novas missões e coleccionáveis. Existe também um novo modo de jogo (score attack – que não experimentei) bem como uma nova dificuldade desbloqueável após completar o jogo uma vez. As versões ocidentais deste No More Heroes: Heroes Paradise são também completamente não censuradas, algo que aconteceu na versão japonesa e nalgumas versões do original Wii, tendo sido essa também uma das razões pelas quais na altura decidi optar por esta versão. No entanto, a parte norte da cidade foi completamente barrada nesta versão, embora a mesma ainda esteja visível no mapa. Tendo em conta o quão aborrecido é explorar a cidade e a falta de um mecanismo de fast travel eficiente, terem cortado um terço da mesma acabou por não ser uma má decisão. Em 2020 foi lançado um remaster do original da Wii, mas confesso que não sei o que essa versão traz de diferente do original para além de uma notória melhoria na performance.

The 25th Ward: The Silver Case (Sony Playstation 4)

Depois de ter jogado o The Silver Case do Suda51 e ter ficado muito intrigado com a sua história bizarra e mecânicas de jogo não convencionais, fiquei também com vontade de jogar a sua sequela. O original havia sido lançado originalmente em 1999 para a Playstation, tendo recebido uma remasterização e localização para inglês anos mais tarde. Este 25th Ward começou por ser lançado como um jogo mobile exclusivamente no mercado japonês algures em 2005, tendo acabado também por receber uma remasterização e localização para inglês anos mais tarde. O meu exemplar veio também do eBay, algures em Janeiro e creio que também me custou algo à volta dos 12€.

Jogo com caixa

Sinceramente nem sei muito bem como abordar a história, pois já o Silver Case abordava uma sociedade algo distópica com um (ou mais) serial killers envolvidos e também uma forte conspiração política por detrás. Este jogo já decorre uns anos após os eventos do jogo anterior na nova 25th Ward, um novo distrito urbano (que presumo que se refira a Tóquio) mas com governo independente e que uma vez tenta controlar os seus habitantes. A história do primeiro Silver Case era contada através de duas narrativas em paralelo, mas nesta sequela temos não duas, mas três narrativas diferentes para explorar. A primeira que podemos explorar, e diria a principal, é o arco Correctness, onde uma vez mais encarnamos num observador silencioso e acompanhamos a aventura de um conjunto de detectives que vão investigar uma série de mortes misteriosas num grande complexo habitacional. Quando terminarmos o quinto capítulo do arco Correctness desbloqueamos os outros dois. O Matchmaker leva-nos na companhia de 2 agentes da Federal Adjustment Bureau, uma organização governamental secreta que tem a tarefa de “ajustar”, ou seja, eliminar, habitantes indesejáveis e o outro arco de história é, uma vez mais, o Placebo. Aqui encarnamos novamente no antigo repórter Tokio Morishima que, embora esteja agora amnésico, irá também investigar os acontecimentos estranhos que por lá estão a decorrer. E nos primeiros capítulos de cada um destes arcos, a narrativa irá incidir sobre os mesmos acontecimentos, mas com perspectivas diferentes. Já nos restantes, cada narrativa irá evoluir de forma independente e abordar outros temas.

Dizer que a narrativa é bizarra é pouco

Tal como no Silver Case original, cada um destes arcos foi escrito por pessoas diferentes, com Goichi Suda a escrever o arco Correctness, o Placebo é escrito pelo mesmo autor do Placebo no primeiro Silver Case e para o Matchmaker há também um novo escritor. Todos têm o seu quê de bizarro, mas o Correctness é de longe o mais bizarro. Tanto que por vezes nem nos conseguimos aperceber se encarnamos no tal observador silencioso, ou num dos outros dois detectives que iremos acompanhar mais de perto. O Placebo, é uma vez mais o que faz mais sentido pelo menos nos primeiros capítulos, enquanto a narrativa vai abordando os mesmos acontecimentos.

Não é só a narrativa que é absurda. Por vezes a jogabilidade também nos surpreende como alguns segmentos que satirizam os RPG

De resto, no que diz respeito às mecânicas de jogo, este continua a ser uma aventura gráfica / visual novel na primeira pessoa, mas com mecânicas de jogo não muito convencionais. Todos os menus com as acções que podemos escolher são apresentados na forma de poliedros ou prismas que podemos rodar livremente e cada face representa uma acção como mover, falar, observar, consultar o inventário, entre outros, sendo que nem sempre todas as acções estão disponíveis e nem sempre as acções fazem sentido. Por exemplo, o comando look que deveria ser apenas o de observar, muitas vezes é o que despoleta diálogos e faz com que a narrativa avance. Quando temos de nos deslocar e explorar os cenários, isto também é feito numa perspectiva de primeira pessoa, onde os destinos aparecem nas extremidades do ecrã e podemos seleccionar para onde queremos ir com o d-pad. Naturalmente que teremos também bastantes puzzles para resolver, alguns bastante simples como inserir códigos PIN ou passwords onde a parte mais chata é a de escolher cada caracter ao rodar poliedros complexos em que cada face do poliedro corresponde a um dos caracteres. Para números até se faz bem, mas quando são letras, sinceramente é tempo desnecessário que perdemos ao rodar e rodar até encontrar a letra pretendida. Nestes puzzles de passwords, muitas vezes as pistas estão escritas em itens que carregamos pelo que os deveremos inspeccionar anteriormente, já noutros as pistas vão sendo dadas através dos diálogos, pelo que convém ir apontando sempre que algumas palavras ou números surjam salientados no ecrã. É que para um jogo com fortes mecânicas de visual novel, não nos dá qualquer possibiliade de consultar diálogos passados, nem de avançar texto já lido caso queiramos rejogar algum capítulo.

Muitos dos puzzles obrigam-nos a inserir códigos e passwords. Mas quando são letras, navegar pelo poliedro até encontrar a letra pretendida é um bocado chato

No que diz respeito à parte audiovisual, é um jogo que tem visuais muito peculiares, tal como o seu predecessor. As imagens que representam os cenários que apesar de serem estáticas, até vão sendo mais detalhados (visto que o jogo foi completamente refeito nesta versão), mas todos os intervenientes surgem, na maioria das vezes representados a preto-e-branco, com alguns tons de vermelho a salientarem-se também, pelas razões óbvias. No fundo do ecrã vamos tendo também algumas animações algo aleatórias como no primeiro Silver Case. Já no que diz respeito ao som, uma vez mais não há qualquer voice acting e os diálogos são sempre acompanhados daquele ruído irritante que parece saído de uma máquina de escrever. Já as músicas formam uma banda sonora até algo eclética possuindo na sua maioria temas jazz ou electrónica mais experimentais.

Visualmente é um jogo muito peculiar, mesmo ao estilo do Goichi Suda

Agora conhecendo o Suda 51, é claro que todas estas escolhas são propositadas, tanto na narrativa bizarra, obtusa e por vezes absurda, como nas mecânicas de jogo nada convencionais e audiovisuais muito peculiares. Tal como o primeiro Silver Case não vai ser um jogo que irá agradar a toda a gente. Eu próprio ainda nem sei muito bem o que pensar disto, a não ser que é um jogo muito estranho e não me deixou indiferente. Fica-me a faltar jogar o Flower, Sun and Rain da Nintendo DS que tem o repórter Tokio Morishima como protagonista, a ver se o apanho a um bom preço.

The Silver Case (Sony Playstation 4)

The Silver Case é uma visual novel muito peculiar que foi lançada originalmente em 1999, apenas no Japão e para a primeira Playstation. É o primeiro jogo lançado de forma independente pela Grasshopper Manufacture, o estúdio liderado por Suda 51, que por sua vez possui muitos outros jogos bizarros na sua carteira como o Killer 7 que já cá trouxe no passado. Eventualmente fizeram um remaster que acabou por ter um lançamento físico para a PS4, cujo meu exemplar veio do eBay algures no mês passado de Agosto por cerca de 13€.

Jogo com caixa

O jogo leva-nos para uma versão distópica de Tóquio no presente, onde começamos por nomear a personagem que vamos encarnar nesta aventura. No prólogo, fazemos parte de uma equipa de intervenção de forças especiais da polícia onde acompanhamos uma operação de perseguição de um antigo serial killer que se escapou do seu hospital psiquátrico mas as coisas acabam por não correr lá muito bem. A partir do capítulo seguinte, a nossa personagem é transferida para uma unidade policial diferente, a Heinous Crime Unit, onde irá colaborar com outros detectives na investigação de vários crimes, muitos relacionados com o tal serial killer do prólogo. À medida que vamos avançando no jogo, e logo mal terminemos o primeiro capítulo, vamos também desbloquear uma aventura paralela sobre o nome de Placebo. Estes capítulos expandem a história principal, pois iremos explorar os mesmos eventos e acontecimentos de cada capítulo, mas através de Tokio Morishima, um ex-jornalista que está também a investigar o tal serial killer. Já os capítulos onde jogamos com o herói que nomeamos estão agrupados sobre o nome de Transmitter.

É inegável, The Silver Case possui uma apresentação muito incomum

No que diz respeito às mecânicas de jogo, este é um jogo algo bizarro nesse aspecto também, pois mistura conceitos de aventura gráfica com visual novels. Portanto, para além de ler diálogos, ocasionalmente também nos vamos poder movimentar livremente pelos cenários, mas numa perspectiva de primeira pessoa. As mecânicas de jogo aqui também não são tão intuitivas quanto isso, pois temos de optar primeiro por activar qual a acção que queremos desempenhar, seja movimentar, interagir com algum objecto ou pessoa à nossa volta, explorar o inventário ou chamar o menu que nos permite gravar o progresso no jogo, alterar opções, entre outros. E uma vez activada a opção de nos movimentarmos, é aí que podemos finalmente explorar os cenários. Aqui apenas nos podemos virar em ângulos de 90º, sendo que o jogo nos informa através de pistas visuais se podemos posteriormente avançar na direcção pretendida ou não. Isto porque a pairar no ar em cada cenário que podemos explorar estão uma série de triângulos coloridos ou estrelas douradas. Os triângulos indicam zonas onde nos podemos movimentar, já as estrelas indicam zonas que possuem alguma coisa com que interagir, seja uma porta, objecto ou pessoa para falar. Ocasionalmente vamos tendo alguns puzzles e nos primeiros capítulos é interessante que nos darão alguns puzzles onde temos de decifrar passwords como se estivéssemos numa aula de ciber segurança.

Quando finalmente podemos fazer alguma coisa, a interface também não é a mais intuitiva de sempre

Transmitter e Placebo, apesar de possuirem as mesmas mecânicas de jogo base, são bem diferentes entre si. A narrativa de Transmitter é bem mais obtusa e muito provavelmente não iremos apanhar metade da história, enquanto que no Placebo, os acontecimentos sendo investigados por um jornalista acabam por ser melhor explicados, pelo que recomendo vivamente que joguem o capítulo Placebo logo após terminarem o episódio do Transmitter respectivo. Na história Transmitter é também onde vamos acabar por interagir com mais personagens e explorar mais cenários, já nos Placebo, apesar de Tokio ir explorando um ou outro cenário, tudo onde interagimos está no seu quarto: o PC onde consultamos/enviamos e-mails ou as suas notas pessoais, o telefone e a sua tartaruga de estimação.

Apesar de termos muitas imagens minimalistas e estáticas, ocasionalmente temos alguns clipes de video

Portanto temos mecânicas e narrativa bizarras, só falta mesmo os visuais serem bizarros para podermos realmente afirmar que isto é uma obra do Suda 51, o que acaba mesmo por acontecer. Tipicamente as visual novels possuem ecrãs com backgrounds bem detalhados, imagens das personagens com as quais vamos interagindo e ocasionalmente algumas imagens bem mais detalhadas de momentos chave na história. Aqui tudo é apresentado numa pequena janela no centro do ecrã, onde ocasionalmente também poderemos ver alguns clipes de vídeo em live action ou outras animações. Não existe qualquer voice acting e os textos são sempre acompanhados de uns ruídos como se tivessem saído de uma máquina de escrever. Em ecrã de fundo, atrás da janela de acção e dos diálogos, vamos tendo algumas animações em loop constante, que vão sendo distintas consoante o capitúlo na história onde vamos. São visuais muito estranhos e o texto não lhes faz justiça. As músicas essas sinceramente gostei bastante, sendo na sua maioria composições electrónicas mas sempre com aquele feeling noir que se encaixa bem na narrativa.

Portanto este The Silver Case foi de facto uma surpresa interessante. É sem dúvida um jogo que não irá agradar a toda a gente, quer fãs de visual novels, quer fãs de jogos de aventura, pelas sua apresentação, narrativa e mesmo jogabilidade muito fora do convencional. Mas é também precisamente pela conjugação de todos esses factores que este Silver Case me despertou o interesse. Vou estar atento a ver se encontro a um bom preço a sua sequela 25th Ward, bem como o Flower, Sun and Rain da Nintendo DS.