Clive Barker’s Undying (PC)

Ao longo das últimas semanas tenho vindo a jogar, em várias sessões espaçadas, Clive Barker’s Undying, um first person shooter datado de 2001 que apresenta algumas mecânicas de jogo bastante interessantes para a sua época. Tal como o nome indica, o jogo contou com a colaboração do conhecido autor de terror Clive Barker na concepção da sua narrativa. A razão que finalmente me levou a pegá-lo (depois de o ter na colecção durante vários anos) foi um desafio lançado pelos meus colegas do podcast TheGamesTome, no âmbito da rubrica backlog battlers. Como é habitual sempre que trago um jogo dessa rubrica, deixo abaixo o episódio correspondente do podcast.

Undying transporta-nos para o ano de 1923, quando Patrick Galloway, veterano da Primeira Guerra Mundial, recebe um pedido de ajuda urgente do seu antigo amigo Jeremiah Covenant. Ao viajar até à mansão de Jeremiah, situada algures na costa irlandesa, Patrick encontra-o muito doente e enfraquecido. Jeremiah conta-lhe que a sua família está amaldiçoada: vários anos antes, ele e os quatro irmãos encontraram na biblioteca do pai um livro sobre o oculto e decidiram, por brincadeira, recitar um dos rituais descritos. O acto acabou por condenar toda a família, pois os irmãos de Jeremiah enlouqueceram e morreram em circunstâncias extremas. Agora, os seus espíritos regressaram para assombrar a mansão, e Jeremiah teme ser o próximo, pedindo-nos ajuda para pôr um ponto final nesta maldição.

Jogo com caixa e manual

Este é um first person shooter da escola clássica: sem regeneração de vida, sem checkpoints automáticos e sem limite para o número de armas transportadas. Ainda assim, introduz uma série de mecânicas inovadoras para o seu tempo, como o uso de feitiços mágicos. Por defeito, o botão esquerdo do rato dispara a arma equipada (de fogo ou não), enquanto o direito activa o feitiço seleccionado. Outras teclas permitem alternar entre armas ou itens do inventário, ou abrir menus circulares com os ícones das magias e armamento disponíveis, uma solução que viria a inspirar vários jogos de acção nos anos seguintes.

A atmosfera do jogo está bastante bem conseguida para a sua altura!

Os feitiços vão sendo adquiridos à medida que avançamos, e a mana necessária para os usar regenera-se automaticamente com o tempo. O primeiro feitiço, Scrye, é aquele que mais utilizaremos e um dos que mais define o tom do jogo, pois serve tanto para iluminar o caminho como para revelar visões do passado, tornando-se uma ferramenta narrativa além de mecânica. Mais tarde, os feitiços ofensivos entram em cena, e o jogo ganha outro ritmo: entre disparar projécteis de energia ou lançar raios e caveiras explosivas, há uma sensação constante de experimentação. A fluidez com que alternamos entre armas e magia, com os dois botões do rato, é algo que ainda hoje resulta surpreendentemente bem. Outros feitiços como escudos temporários (extremamente útil), ou melhorar drasticamente agilidade também contribuem bastante para os combates frenéticos que o jogo nos arrasta!

Como seria de esperar, Undying é um jogo violento e repleto de criaturas demoníacas

As mecânicas são ainda complementadas por uma série de itens que encontramos durante a exploração. Além das provisões básicas (munições, medkits e explosivos) há também munições alternativas, armadilhas mágicas e artefactos que potenciam as nossas habilidades. Destacam-se os amplifiers, mana wells e arcane whorls, que permitem respectivamente aumentar o poder dos feitiços, o limite de mana e a taxa de regeneração. O meu maior problema com o jogo reside, no entanto, no design dos níveis. Estes são geralmente extensos e labirínticos, o que faz com que passemos muito tempo perdidos. A primeira parte do jogo, passada na enorme mansão de Jeremiah, é exemplar nesse aspecto: repleta de portas que não abrem, mas que, pela sua mera presença, aumentam a confusão. Alguns níveis posteriores sofrem do mesmo mal, e o que mais senti falta foi de um mapa ou de alguma indicação clara sobre a direcção do objectivo seguinte.

O feitiço Scrye, para além de nos permitir ver melhor no escuro, permite-nos também ver cenas ocultas, muitas delas necessárias para avançar na narrativa

Visualmente, Clive Barker’s Undying utiliza o motor gráfico do Unreal, que em 2001 já começava a acusar alguma idade. Ainda assim, o design das criaturas é notavelmente eficaz, e os “mundos alternativos” que visitamos mais adiante na história têm um aspecto visual distinto e memorável. A banda sonora mistura temas orquestrais com faixas mais ambientais que reforçam a tensão e o terror, enquanto o voice acting é bastante competente para a época, complementado por bons efeitos sonoros também. No entanto, a atmosfera é um dos grandes trunfos de Undying. A mansão de Jeremiah, com os seus corredores frios e ecos distantes, transmite constantemente a sensação de que algo nos observa. Os períodos de silêncio são tão opressivos quanto os momentos de combate, e os sons (sussurros, passos, o vento a bater nas janelas) criam uma inquietação constante. É um daqueles jogos em que o som tem tanto peso quanto o que vemos no ecrã.

A jogabilidade mistura armas e magia de forma tão directa que se torna um prazer jogar ainda hoje.

Em suma, Clive Barker’s Undying é um jogo marcante para o seu tempo, tanto pela fusão entre shooter e terror gótico como pela tentativa de contar uma história mais sombria dentro do género. Esperava talvez uma narrativa mais densa, considerando o nome de Clive Barker, mas o resultado continua singular: combates intensos, feitiços interessantes e uma atmosfera arrepiante. Hoje em dia sente-se o peso dos anos, sobretudo pelos níveis labirínticos e na ausência de orientação, mas continua a ser uma experiência fascinante para quem tanto aprecie jogos de terror, como first person shooters cheios de adrenalina. Por fim, para os curiosos, Clive Barker’s Jericho, embora partilhe o nome do escritor e o género first person shooter, nada tem a ver com este Undying.

Skullmonkeys (Sony Playstation)

Tempo de voltar para a primeira Playstation para um jogo muito curioso, que é na verdade o segundo título feito no mesmo universo. O seu predecessor é o The Neverhood, uma aventura gráfica do estilo point and click com todas as personagens criadas e animadas em claymation, ou seja, com base em bonecos de plasticina/barro e as animações feitas com técnicas de stop motion, o que deve dar uma trabalheira descomunal. Esse título havia sido lançado originalmente no PC em 1996, com uma versão PS1 a surgir apenas 2 anos depois e apenas no território japonês. Também em 1998 é lançada esta sequela, o Skullmonkeys que a nível de jogabilidade nada tem a ver, pois este é um jogo de plataformas 2D bem mais tradicional nas suas mecânicas de jogo e é também um título exclusivo para a Playstation. O meu exemplar foi-me trazido por um amigo meu durante o mês de Dezembro, tendo sido comprado no Reino Unido por umas 30£.

Jogo com caixa e manual

Nunca joguei o Neverhood (e o facto desse jogo não ter saído oficialmente cá também não ajuda ao preço) pelo que não conhecia de todo a personagem. Mas aparentemente o jogo decorre logo após os acontecimentos do título original, onde o vilão do jogo, depois de ter sido derrotado, acaba por chegar a um novo planeta, habitado por uma raça de macacos com caveiras no lugar de cabeças e rapidamente os domina e começa a por em prática mais planos maquiavélicos, pelo que nos caberá a nós travá-lo.

Entre certos “mundos” vamos tendo várias animações em claymation para ver e tipicamente são sempre bem animadas.

No que diz respeito às mecânicas de jogo, estas são simples pois o botão X salta e o quadrado corre e caso sofremos dano, perdemos uma vida e voltamos ao último checkpoint que teremos desbloqueado. A maior parte dos inimigos podem ser derrotados ao saltar-lhes em cima, mas teremos no entanto a possibilidade de apanhar inúmeros power ups, alguns que nos dão habilidades extra e/ou outras formas para atacar. Os mais comuns são as esferas coloridas de plasticina que servem apenas como coleccionáveis e a cada 100 temos uma vida extra. As esferas de luz esverdeadas são projécteis que podemos disparar de uma pistola que temos equipada (através do botão O), mas como devem ter entendido, são munições limitadas. Podemos também apanhar uns pássaros que são um outro projéctil (teleguiado) e é disparado com o L1. Esferas brilhantes alaranjadas são itens super poderosos capazes de causar dano em todos os inimigos presentes no ecrã (ao pressionar o R1). O L2 está reservado ao uso de um item muito peculiar: a nossa personagem peida um seu clone pela cabeça, clone esse que pode ser utilizado para tentar atravessar alguns segmentos mais exigentes de platforming sem a penalização de perder uma vida. Por fim, o R2 está reservado ao uso de um outro item, umas cabeças que apanham todos os itens no ecrã. De resto poderemos também encontrar outros itens como vidas extra, espirais que nos podem levar a níveis de bónus, hamsters que orbitam à nossa volta servindo de escudo, pássaros que nos ajudam a planar e assim conseguir saltar mais longe, entre outros. Pelo menos não falta originalidade aqui!

Sempre que encontramos um novo item há também uma explicação em como o utilizar

O jogo é no entanto consideravelmente exigente no seu platforming, obrigando-nos a fazer vários saltos que precisam de timings muito precisos ou até alguns saltos de fé e visto que basta um toque para perdermos uma vida, iremos repetir algumas secções várias vezes até triunfar. Felizmente o jogo está repleto de vidas extra, que serão bem precisas! De resto, e ainda na jogabilidade, apesar de temos vários power ups diferentes, estes são consideravelmente reduzidos e uma pequena coisa que não gostei é o facto de apenas sermos informados o quanto temos desses vários itens em dois momentos: quando os apanhamos surge um contador no ecrã que nos diz quantos temos e depois desaparece, ou então no menu de pausa. Acho que seria boa ideia ter esses contadores, mesmo que fosse de uma forma mais discreta, sempre visíveis no ecrã.

É verdade que o jogo se pode tornar repetitivo, exigente e frustrante, mas tem também muito bons momentos!

Mas apesar de a sua jogabilidade ser simples, porém exigente, acho que é mesmo no departamento audiovisual que este jogo marca pontos. Isto porque o jogo não só possui todos os seus personagens e partes do cenário como sprites pré renderizadas em claymation, o próprio universo onde o jogo decorre é bastante bizarro, não só pelas criaturas que vamos enfrentando, mas também pelos próprios cenários. Ocasionalmente temos também alguns bosses para defrontar e há um deles que é literalmente uma cara digitalizada de um dos criadores do jogo! Pelo meio vamos tendo também vários clipes de vídeo em claymation que vão narrando um pouco a história. São naturalmente clipes bastante bem humorados! A banda sonora é também toda uma outra experiência surreal, sendo bastante eclética, com músicas com uma influência mais jazz, country e com algumas escolhas algo bizarras. A música do nível bónus em particular é uma música em guitarra acústica com uma letra super motivacional do tipo “isto é um nível bónus, relaxa que não há inimigos aqui” e que me apanhou completamente despercebido da primeira vez que a ouvi.

Todas estas animações devem mesmo ter dado um trabalhão!

Portanto este Skullmonkeys é um jogo muito interessante na sua originalidade, bom humor e claro, todas as animações e músicas algo bizarras. Perde no entanto por se tornar algo repetivo e os segmentos de platforming mais exigentes poderão desapontar. Acredito que não tenha sido um grande sucesso pois depois deste título nunca mais se viu nada da série, o que é pena.

Medal of Honor Underground (Sony Playstation)

Medal of Honor UndergroundO Medal of Honor original, também lançado para a PS1 foi uma lufada de ar fresco nos FPS por alturas em que saiu, atingindo assim um sucesso considerável para que no ano seguinte este MoH Underground acabasse por sair para o mercado, bem como no futuro ainda despoletou uma nova “moda” de shooters sobre a 2a Guerra Mundial, incluindo a série Call of Duty, ou o actual FIFA/PES Militar como lhe gosto de chamar. Tal como Medal of Honor, este MoH Underground também entrou na minha colecção após ter sido comprado ao Mike do blog Gamechest (vão ali aos links na parte direita!) por 2.5€. Apesar de ser a versão platinum, que não levo a mal na PS1, está completo e em bom estado.

Medal of Honor Underground - Sony Playstation
Jogo completo com caixa e manual, versão platinum.

O jogo anterior colocava Jimmy Patterson, como agente da OSS a lutar pelos aliados em diversas missões de infiltramento e sabotagem ao longo de vários teatros de guerra na europa. Antes de cada nível, recebíamos um ligeiro briefing de uma tal Manon Batiste, membro da Resistência Francesa e também da OSS. E é essa Manon Batiste com que jogamos este jogo, onde mais uma vez teremos várias missões de sabotagem por essa europa fora (e Norte de África também), culminando na liberação de Paris, repleta de confrontos “rua a rua”. No final do jogo, ainda podemos jogar uma missão bónus composta por 3 níveis, em que voltamos a encarnar no Jimmy Patterson. Essa missão é completamente hilariante e não tem nada a ver com qualquer evento histórico, sendo talvez uma sátira ao clássico Wolfenstein 3D. Aí temos de investigar um antigo castelo no meio das florestas alemãs que serviu de base para um cientista nazi realizar as suas experiências. Já estão a ver no que isto vai dar, não estão? O resultado é hilariante, com cães dançantes, outros equipados com metralhadoras ou a conduzir half-tracks, soldados zombies, mecânicos ou mesmo armaduras medievais animadas.

screenshot
As velhas catacumbas que serviam de base para a resistência francesa são um dos primeiros cenários que exploramos

Os controlos são os mesmos do jogo anterior, onde temos um esquema por defeito algo arcaico, mas é possível optar entre vários outros esquemas de controlo que melhor se adequam aos shooters modernos nas consolas. O jogo continua também sem uma mira, a menos que apertemos o botão para mirar. Aí surge uma mira no centro do ecrã, que por sua vez fica estático, e apenas podemos mover a mira livremente. Isto não é um aiming down the sights, e este esquema para ter maior precisão apesar de ser mais realista, o facto de termos de estar estáticos não é uma vantagem. De resto, a nível de novidades temos o facto de podermos utilizar alguns veículos, uma das missões andamos num sidecar de uma moto, onde podemos disparar uma metralhadora pesada com munição infinita, por outro lado nalgumas missões de infiltração e sabotagem temos mais uma vez de utilizar artimanhas para passar despercebidos. No jogo anterior tinhamos de nos apropriar das id’s de alguns oficiais nazis, desta vez Manon assume o papel de uma repórter de guerra alemã, equipada com uma máquina fotográfica que podemos até utilizar para fotografar nazis em poses estúpidas.

screenshot
A máquina fotográfica é aqui utilizada como ferramenta de infiltração e para tira fotos a nazis em fotos idiotas.

Visualmente é um jogo bem competente tal como a prequela. Os cenários são bastante variados, com a aventura a começar por catacumbas francesas, passando pelo norte de áfrica, grécia e os seus monumentos históricos, o monte Cassino em Itália, instalações de produção de mísseis V1, ou o regresso a Paris para a sua Liberação, onde locais como o Moulain Rouge podem ser observados. O detalhe gráfico é óptimo tendo em conta o hardware da Playstation. No entanto, como utiliza o mesmo motor gráfico do seu antecessor, o jogo herda também os seus defeitos. A draw distance em locais mais abertos pode ser traiçoeira, pois numa questão de passos deixamos de ver inimigos, mas eles nem por isso deixam de nos ver, e apesar de me ter parecido melhor neste aspecto, ainda presenciei alguns problemas de clipping que sinceramente não me incomodam assim tanto, eram coisas banais na era dos 32-bits. A inteligência artificial mais uma vez tem os seus altos e baixos, com os inimigos capazes de nos emboscar em algumas situações, noutras apenas correm para nós, noutras ainda mais bizarras ficam a correr em círculos sem sequer disparar.

screenshot
Exemplo de algum do artwork que podemos desbloquear

Mas o trabalho de audio está mais uma vez de parabéns. Já o jogo anterior tinha excelente voice-acting para a época, os efeitos sonoros também muito bons e a banda sonora épica foi algo bem cinemático, novidades bem agradáveis para a altura. Esta sequela mantém o mesmo padrão de qualidade em todos esses campos. Para além da música e dos efeitos sonoros das armas, o ruído de fundo em vários níveis está também muito bem implementado.

screenshot
Podemos desbloquear algumas personagens invulgares para o Multiplayer

De resto, fica apenas faltar mencionar o modo multiplayer existente neste jogo e os extras que podemos desbloquear. Falando do primeiro, este consiste num deathmatch para 2 jogadores em split-screen, onde dispomos de vários níveis para jogar e algumas opções para customizar, a sua maioria limites de tempo. Em relação aos extras, para além de desbloquear a missão secreta com Jimmy Patterson, podemos desbloquear vários cheat codes, personagens extra para o multiplayer e material do making-of do jogo, nomeadamente artwork. Também podemos rever os clips de vídeo utilizados no jogo, com várias cenas de documentários da 2a Guerra Mundial.

Assim sendo, Medal of Honor Underground é um óptimo jogo tendo em conta o hardware da PS1. O original foi excelente e revolucionário, este utiliza a mesma fórmula, introduzindo apenas uma ou outra novidade. Mas não deixa de ser um óptimo FPS no catálogo da PS1.