Ultima: Worlds of Adventure 2: Martian Dreams (PC)

Já há bastante tempo que não voltei a pegar na série Ultima, uma das mais influentes de sempre nos Western RPGs e não só. A última vez que lhe peguei foi justamente com o Worlds of Ultima: The Savage Empire, um spin-off da série principal que usou o mais recente motor gráfico do Ultima VI para contar uma aventura bem longe de Britannia. E a Origin ainda reaproveitou o mesmo motor gráfico para mais uma dessas aventuras secundárias, nomeadamente este Martian Dreams. O meu exemplar foi comprado na feira da Ladra em Lisboa, algures em 2014, tendo-me custado 5€. Foi um bundle bem interessante de jogos em big box de alguém gostava bastante da Origin Systems, pois ainda tinha trazido também o Ultima V e mais uns quantos Wing Commander.

Jogo em formato big box com 5 disquetes, mapa, manuais e papelada diversa – bons tempos das big box cheias de goodies!

A história até que é bastante interessante. A cutscene inicial leva-nos ao final do século XIX na Expo de 1893, onde um canhão espacial estava a ser mostrado pelo astrónomo Percival Lowel. Este era capaz de disparar uma cápsula cheia de gente directamente para o planeta Marte. Ora, quando uma série de celebridades da época estavam dentro da cápsula para demonstração, alguém sabota o canhão e todas aquelas personagens ilustres (como Thomas Edison, Theodore Roosevelt, Marie Curie, Lenine, Rasputin, entre outros) acabam por ser disparadas para Marte e ficam lá à espera de resgate. Entretanto, fast forward para 100 anos depois, o Avatar recebe uma visita de uma pessoa desconhecida que pede a sua ajuda para ir resgatar todas aquelas pessoas de Marte. Em conjunto com o seu amigo Dr. Spector (Warren Spector, uma vez mais o produtor do jogo a dar a sua cara), acabam por usar o poder das Moonstones para viajar no tempo para o passado e juntarem-se a Nikola Tesla que lança mais uma cápsula para Marte e partimos assim à aventura na exploração do planeta vermelho. Quando lá chegamos descobrimos uma civilização marciana em ruínas, pelo que teremos de voltar a reactivar uma série de edifícios e ir interagindo com os restantes terráqueos que por lá andam. Eventualmente iremos mesmo interagir com os marcianos, que eram uma forma de vida vegetal extremamente avançada e inteligente. Não querendo revelar muito mais, deixem-me só reiterar que achei a história muitíssimo interessante, desde a interacção com todas aquelas personalidades da época, bem como toda a trama por detrás dos marcianos e o declínio da sua civilização.

Aqui temos o mesmo sistema de diálogos onde poderemos usar uma série de palavras chave para falar com os NPCs. A diferença é que temos muitas personalidades ilustres da era Victoriana para interagir

E tal como é habitual na série Ultima, começamos a aventura a ser interrogados e as respostas que vamos dando irão definir alguns traços da nossa personalidade e claro, os stats da nossa personagem. A diferença é que quem nos faz as perguntas desta vez é nada mais nada menos do que o Sigmund Freud. Uma vez chegados a Marte temos toda a liberdade de explorar da forma que quisermos, embora nem todas as localizações estejam disponíveis inicialmente, enquanto não desbloquearmos o seu acesso ao terminar alguma quest. De resto, as mecânicas de jogo são muito similares ao Ultima VI e ao The Savage Empire, pois o jogo utiliza o mesmo motor. Ou seja, apesar de ainda termos muitas teclas que representem acções, há já uma maior utilização do rato para uma série de coisas, incluindo o inventory management de cada personagem (o que por vezes é bem chato). No que diz respeito aos combates, magias desta vez não há, mas teremos acesso a imensas armas da época como caçadeiras ou carabinas, bem como armas de fogo e eventualmente armas “futuristas” marcianas.

Warren Spector continua a dar a sua cara, sendo desta vez uma personagem jogável.

Analisando agora os seus gráficos, confesso que gostei bastante deste jogo nesse aspecto. Esta é sem dúvida uma carta de amor à ficção científica do final do século XIX de autores como Julio Verne ou H. G. Wells (este último aqui representado na aventura). Pelo que esperem por visuais muito steampunk, mesmo na civilização marciana! Depois claro, todas as personalidades daquela época que conseguiram aqui incluir, bem como a quantidade de diálogos que possuem, também foi outro ponto muito forte, a sua narrativa. Nada de especial a apontar aos efeitos sonoros, já as músicas confesso que também as achei bastante agradáveis.

Portanto este segundo Worlds of Ultima é um outro spinoff muito interessante. É um RPG bem competente tal como os Ultima principais, simplesmente não acrescenta nada de novo na jogabilidade pois utiliza o mesmo motor de jogo que o do Ultima VI. Mas a sua história bastante original, narrativa elaborada e audiovisuais bem competentes para a época tornam-o num clássico, a meu ver. E é um jogo gratuito no gog.com, pelo que recomendo vivamente que o experimentem.

Worlds of Ultima: The Savage Empire (PC)

Já há algum tempo que não voltava a pegar na série Ultima. Desta vez o escolhido foi o primeiro jogo da série secundária de Worlds of Ultima, que utiliza as mecânicas base do Ultima VI, mas é passado num universo completamente distinto do mundo imaginado por Lord British. Mas não deixa de ter as suas ligações à série principal, claro. Este meu exemplar digital se a memória não me falha foi oferecido quando criei a minha conta no GOG.com. Isso ou então foi comprado numa das promoções que ocasionalmente fazem em que colocam os jogos da franchise inteira à venda por um preço mais reduzido.

Worlds of Ultima - PCA acção neste jogo decorre algo após os acontecimentos narrados em Ultima VI, onde mais uma vez tomamos o papel de Avatar. A narrativa começa com Avatar a levar as misteriosas moonstones (que activam os portais para o mundo de Britannia) ao seu amigo Dr. Rafkin, curador do museu de história natural lá do sítio para que as pudesse analisar. Rafkin estava acompanhado de um jornalista algo sensacionalista chamado Jimmy Malone e após tentar fazer algumas experiências com a Moonstone, ocorre um acidente que nos transporta para uma outra dimensão, um mundo com enormes e densas selvas, várias tribos diferentes, e dinossauros também. Em linhas gerais, a nossa tarefa é de unir todas as tribos de forma a que todos juntos consigam combater a ameaça das Myrmidex, uma praga de formigas gigantes que ataca os humanos. Para isso teremos primeiro de auxiliar certas pessoas como líderes ou xamãs tribais a resolver alguns problemas que os apoquentam (como por exemplo assassinar o tirano que ursupou o poder de alguma tribo, resgatar pessoas raptadas, entre outros).

Tal como no Ultima VI, as palavras chave que desencadeiam novos diálogos aparecem sobressaídas
Tal como no Ultima VI, as palavras chave que desencadeiam novos diálogos aparecem sobressaídas

As mecânicas de jogo na sua essência são muito similares às de Ultima VI, pelo que recomendo a leitura desse artigo para mais detalhe. Utilizando o mesmo motor gráfico de raiz, este jogo mantém as mesmas interfaces e um uso mais regular do rato para seleccionar comandos, fazer gestão de inventários das diferentes personagens, ou simplesmente seleccionar os alvos para atacar, aquando activarmos o modo de combate. A grande diferença é a falta de reagentes mágicos do mundo de Britannia, pelo que as magias são muito mais simplificadas. Aqui apenas Triolo pode conjurar feitiços que consistem essencialmente em escolher 1 de três itens que se podem oferecer a um de três ídolos distintos, havendo assim 9 possibilidades. Fora isso, o crafting continua a marcar a sua presença para as mais variadíssimas coisas, desde itens do dia-a-dia até armas de fogo, munições e granadas.

Algumas personagens que podem fazer parte da nossa "party" são caras conhecidas
Algumas personagens que podem fazer parte da nossa “party” são caras conhecidas

Algo também engraçado de notar é que para além do Avatar que é uma constante em toda a série, e do Lord British também dar o ar de sua graça em certas alturas, alguns dos nossos companheiros de Britannia têm aqui sósias como o já referido Triolo/Iolo, Shamuru que é na verdade um clone de Shamino, ou Dorkray/Dupre. Warren Spector é também uma personagem que marca mais uma vez a sua presença, para além de já ter aparecido no Ultima Underworld, como pseudo-vilão. E escusado será dizer que Warren Spector é um dos criadores do jogo e uma das personalidades mais conhecidas da comunidade de developers, com participações noutros clássicos como System Shock, Thief e Deus Ex.

Estas pequenas cutscenes eram algo de luxo para um IBM PC na época
Estas pequenas cutscenes eram algo de luxo para um IBM PC na época

Graficamente é um jogo que nada deve ao Ultima VI, sendo bastante colorido e introduzindo também algumas pequenas cutscenes em 2D que para a época eram sem dúvida bastante impressionantes. Os diálogos são extensos e todas as personagens têm sempre algo relevante a dizer, mesmo aquelas completamente genéricas e que não são importantes para a história. O mesmo pode ser dito dos retratos dessas mesmas personagens, que vão sendo também variados. As músicas têm em regra geral também uma óptima qualidade! Nota-se perfeitamente que em séries como Ultima ou Wing Commander a Origin esmerava-se bastante em apresentar algo com óptimos audiovisuais.

No fim de contas, apesar de fugir um pouco ao mundo fantasioso de Britannia que esta série sempre nos habituou, este primeiro Worlds of Ultima não deixa de ser um RPG bastante completo, e este “Savage Empire” acaba por ser uma interessante homenagem a obras fantasiosas como o Lost World de Sir Arthur Conan Doyle.

Ultima Underworld (PC)

Ultima Underworld 1Voltando aos RPGs clássicos de PC, o Ultima Underworld é um spin-off da série principal, mas onde o dungeon crawling dos primeros jogos da série foi novamente explorado e bastante evoluído, resultando num jogo muito avançado para os padrões de 1992, tanto a nível de jogabilidade e liberdade de escolhas, como tecnicamente, sendo superior em muitos aspectos a jogos como Wolfenstein 3D ou mesmo o próprio Doom que saiu mais tarde. De resto, tal como todos os outros Ultima que tenho no PC (pelo menos por enquanto) foram comprados no site GOG.com, numa das habituais promoções em que eles disponibilizam toda a série por um preço reduzido. A versão física que tenho é de uma compilação com o Wing Commander II, que veio de oferta dentro de outro jogo que comprei enquanto estive em Belfast no Outono de 2016.

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Aqui mais uma vez encarnamos no papel de Avatar, embora desta feita não fomos chamados pelo Lord British. Após os acontecimentos do Ultima VI, alguém chamado Sir Cabirus quis fundar uma nova colónia na Isle of the Avatar, berço da perígosíssima dungeon The Stygian Abyss, que unisse todas as raças e virtudes num único lugar. Por algum motivo Sir Cabirus morreu, a sua colónia utópica entrou em desgraça, sobrevivendo apenas a população à superfície, selando depois a entrada da dungeon, deixando lá os restantes sobreviventes. Bom, mas o que isso tem a ver connosco? Somos chamados da terra pela aparição de um antigo feiticeiro que nos diz que Britannia corre grande perigo. Somos então levados à povoação da Isle of the Avatar, onde vemos Ariel, filha do Barão Almric, a ser raptada pelo feiticeiro Tyball. Somos depois interceptados pela guarda real, que achando que somos nós os culpados, nos atiram para a dungeon, com a missão de sair de lá com Ariel, ou nunca mais sair.

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Vamos subindo de nível com a experiência ganha em combates ou quests, mas mais uma vez para ganhar outros atributos teremos de meditar nas várias shrines.

Como é habitual nos RPGs ocidentais, antes de começar o jogo propriamente dito, temos de criar a nossa personagem, desde definir o seu sexo, classe e skills extra para a customizarmos à nossa medida. As classes variam de guerreiros, paladinos, druidas ou feiticeiros, cada uma com as suas próprias fraquezas e mais valias, mas podemos também assignar alguns skill points a outras áreas, como um feiticeiro ter habilidade em manusear espadas por exemplo. Claro que podemos também customizar o aspecto da nossa personagem. A partir daí somos então largados na grande caverna que é o The Stygian Abyss e desde cedo teremos de por à prova as nossas habilidades. Este é um jogo totalmente visto na primeira pessoa, mas permite-nos olhar em 360º, coisa que nem o Doom deixava. A nossa HUD mostra-nos à esquerda uma série de acções que podemos desempenhar, quer ao clicar nas mesmas com o ponteiro do rato, quer utilizando os atalhos do teclado. Acções como observar, apanhar, atacar e usar são alguns dos exemplos.

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Guardar, usar, ou equipar items é tão simples como arrastá-los para o inventário, boneco ou mesmo a própria boca, se forem comestíveis.

A movimentação também pode ser feita inteiramente com o rato. Ao mover o ponteiro na view do jogo, vemos o ponteiro do rato a mudar de direcção. Por exemplo, se mantivermos o ponteiro no meio, mas acima e clicarmos, iremos mover em frente. Mas se deslizarmos o ponteiro para baixo, a sua forma muda para uma seta que aponta para baixo, o que nos deixa movimentar nessa direcção e por aí fora nas outras direcções. Mas também podemos usar uma espécie de proto-WASD, em que o A e o D não fazem strafe, mas sim viram-nos nessa direcção. O strafing fica para os botões Z e C, o que não é nada habitual para os jogos em 3a pessoa a que estamos habituados. Olhar para cima e para baixo também tem teclas próprias pelo que para quem jogar isto pela primeira vez ainda vai causar alguma confusão. Sinceramente não sei se existe algum patch não oficial que mapeie os controlos de uma forma semelhante ao WASD+rato que temos nos dias que correm, mas era bom que existisse. De resto, equipar e usar items, tudo é feito ao arrastar os objectos para o inventário ou para o “boneco” da nossa personagem do lado direito do ecrã. De resto, para as magias, precisamos de encontrar runestones, e com elas construir os feitiços ao agrupá-las (até um máximo de 3 pedras), formando as palavras que nos permitem invocar os feitiços, que tanto podem ser de ataque, como tremores de terra, ou simplesmente de suprote, como criar comida. Os ataques também são feitos com o rato e tal como o movimento, manter o ponteiro em diferentes posições do ecrã resultam em ataques um pouco diferentes.

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O automap foi uma adição benvinda, bem como a possibilidade de escrever notas

De resto este é um jogo exigente numa perspectiva de simulação. Isto porque podemos morrer à fome, as nossas fontes de luz extinguem-se, a personagem fica fatigada e precisa de descansar e o equipamento desgasta-se. Sendo assim, à medida em que vamos explorando este enorme labirinto temos de o fazer sempre de forma cuidada. Os inimigos estão sempre à espreita e estando nós sempre às escuras, arranjar fontes de luz, como velas, archotes, candeeiros a óleo ou mesmo através de magias é algo muito importante. A fadiga também deve ser combatida ao descansar por várias horas, mas por favor apaguem os archotes senão eles são consumidos com o passar do tempo e podemos mesmo acordar completamente às cegas. Interagir com NPCs que vamos encontrando, e encontramos bastantes e de várias raças e linguagens, é outro aspecto muito importante, pois permite-nos fazer trocas, cumprir sidequests (e as principais claro), ou em alguns casos também podemos pedir para reparar o nosso equipamento, sempre com algo para dar em troca. De resto, tudo se resume à exploração, e o facto deste jogo ter automapping e também nos deixar escrever notas no mapa é uma grande ajuda. Ainda falando nos diálogos, mais uma vez podemos dar diferentes respostas aos NPCs, o que por sua vez resulta em diferentes diálogos e resultados, pois podemos facilmente irritar alguém e não receber mais nada em troca.

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Podemos abordar os diálogos de várias formas, que por sua vez vão dando resultados diferentes nas conversas

Como já referi por aí, graficamente é um jogo impressionante. A movimentação é completamente em 3D, ao contrário da movimentação em “grelha” de dungeon crawlers na primeira pessoa que foram lançados anteriormente, como os primeiros Wizardry ou mesmo os próprios Ultimas, por exemplo. Os cenários, para além de terem texturas detalhadas para a altura, também permitiam desníveis e paredes oblíquas, algo que no Wolfenstein 3D, também lançado em 1992 e aclamado como um dos mais importantes jogos que fizeram alavancar os videojogos na primeira pessoa, não fazia. Outras coisas como efeitos de iluminação e a tal capacidade de olhar quase em 360º eram algo verdadeiramente inédito para a época. Claro que um jogo como Doom ou mesmo o Wolfenstein 3D têm uma jogabilidade muito mais simples e frenética, mas não deixa de ser impressionante tudo o que conseguiram fazer neste jogo. As músicas são boas, mudando dinamicamente ao longo do jogo, consoante se estamos a atacar ou ser atacados, ou a explorar.

Por todas estas razões, e ainda muitas outras haveria a mencionar, Ultima Underworld é um clássico absoluto dos RPGs ocidentais. Para além de ter sido uma obra prima a nível técnico, tornou-se num dos videojogos basilares que influenciou muitos outros que lhe seguiram, desde a série The Elder Scrolls, passando por outros “RPGs” de culto como Deus Ex, ou as próprias séries System Shock / Bioshock que lhe sucederam.

Ultima VI: The False Prophet (PC)

Voltando à série clássica de Richard Garriot, os Ultima são uma franchises mais influentes nos RPGs no geral, tanto nos ocidentais, como nos japoneses, a par de Wizardry que por sua vez ainda hoje dá cartas em terras do Sol Nascente. E este The False Prophet é o capítulo que encerra a trilogia da Age of Enlightnment, começada no Ultima IV e que até hoje é bastante única no seu conceito. Tal como todos os outros Ultima, à excepção do IV que também o tenho para a Master System, este também faz parte de um pack que comprei no GOG há uns tempos atrás por um óptimo preço a rondar os 7 e poucos euros. Mas mais tarde ou mais cedo vou querer andar atrás das big boxes de todos os jogos desta série, talvez até mais cedo do que estaria a planear.

Ultima VI - PCOra bem, mais uma vez tomamos o papel de Avatar, uma pessoa perfeitamente normal do dia-a-dia comum, mas por várias vezes é chamado por Lord British e visitar o seu mundo de Sosaria/Britannia e salvá-lo de algum perigo. Bom, na verdade no Ultima IV não havia perigo nenhum, apenas fomos chamados para partir numa jornada algo espiritual e de iluminação, em que nos deveríamos tornar no exemplo a seguir por todos os Britannians ao viver de acordo com princípios e virtudes fundamentais. Em Ultima V, apesar de Britannia ter sido dominada por Blackthorne, o nosso papel como Avatar é na mesma posto em causa e em Ultima VI tal não é muito diferente. Aqui somos chamados a Britannia pois esse mundo tem sido invadido por Gárgulas demoníacas que estão a aterrorizar a população e Lord British espera que nós as consigamos expulsar ou até entender o que está por detrás dos seus motivos. Felizmente muitos dos nossos antigos companheiros dos outros jogos, como Shamino ou Iolo estão de volta para nos ajudarem nesta aventura.

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“Altes grafiques” para os padrões de 1990.

Para além de ter existido uma autêntica evolução nos audiovisuais neste Ultima VI, algo que irei referir melhor lá para a frente, houve também mudanças na jogabilidade, a começar pelo suporte ao rato e todo o interface no geral. O ecrã continua dividido na zona de jogo, a lista de personagens na nossa party (onde agora podemos consultar individualmente o equipamento e inventário de cada um tudo através de itens gráficos) e a zona onde lemos os diálogos e outras mensagens de jogo. Apesar de continuar a ser possível utilizar atalhos de teclas para as mais variadíssimas acções (mover, apanhar items, largar items, usar, falar, atacar, entre outros), agora é também possível clicar em ícones que representam essas mesmas acções, bem como usar o rato para indicar onde queiramos mover a nossa personagem. O movimento pelo rato ainda não é perfeito, pois temos de levar o ponteiro para uma das bordas da zona de jogo até surgir uma setinha, só aí é que eles se podem mover nessa direcção. Mais vale continuar a utilizar as setas do teclado, mas é uma mudança. E mesmo existindo vários ícones de acções, e muito menos teclas que representem diferentes acções, ainda está algo longe da “simplicidade” ou se calhar “melhor arrumação” das interfaces dos RPGs modernos. Mas começa a andar lá perto e é muito interessante podermos assistir a essa mudança. Alterar itens do inventário ou equipamento acabou por se tornar muito mais simples, sendo quase idêntico ao que viria a ser utilizado em jogos como Diablo, por exemplo.

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Como habitual, temos uma série de perguntas a responder antes de começar a aventura que nos irão definir enquanto personagem

Outra coisa que se nota imediatamente mal se começa a aventura é o enorme cuidado que colocaram na narrativa, na complexidade da história e nas relações dos NPCs, que têm as suas próprias rotinas diárias. Tal como nos 2 jogos anteriores, devemos falar com todos os NPCs que nos encontramos e tentar-lhes perguntar por várias palavras chave. Desta vez os diálogos são bem mais extensos, consisos e para facilitar as coisas, muitas das palavras chave já vêm sobrecarregadas para se evidenciarem. De resto, o nosso karma é algo a ser medido. Matar inocentes, ou roubar descaradamente, enquanto que é algo perfeitamente possível de se fazer, penalizam-nos enquanto Avatar e é necessário manter o karma acima de 75 pontos se alguma vez quisermos chegar ao fim. Bom, eu tive a investigar um pouco antes de jogar e há um glitch que pode ser explorado à vontade, que nos vai incrementando o karma sempre que o repitamos. Então sim, roubei que me fartei.

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Visitar Lord British é sempre uma boa ideia para ele nos regenerar a saúde de todo o grupo.

No início a nossa missão consiste em defender as Shrines das 8 virtudes, sendo esses os focos principais das Gárgulas em Brittania. Mas o jogo é completamente não-linear, podemos abordar qualquer uma em primeiro lugar e depois de o fazer, os restantes objectivos têm de ser descobertos ao falar com os NPCs e mais uma vez vamos tendo uma grande liberdade de escolha. Essas shrines, se usadas em conjunto com as suas runas próprias (mais umas coisas que temos de procurar), podem ser usadas para meditação e subir de nível, se tivermos recolhido pontos de experiência suficientes em batalha para tal. Mediante a shrine escolhida, vamos ganhando diferentes atributos ao subir de nível, umas dão-nos mais força, outras agilidade, outras defesa e por aí fora. O nível máximo que podemos alcançar é 8 para cada personagem (e sim, podemos recrutar imensa gente) o que apesar de poder parecer pouco, é bem suficiente se soubermos o que estamos a fazer, quais feitiços comprar e itens equipar nas batalhas mais “pesadas”.

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Shamino, um dos nossos companheiros, tem um retrato muito parecido ao do próprio Richard Garriott

A outra coisa de diferente que notamos logo ao começar o jogo são os visuais bem superiores. Apesar de Richard Garriot afirmar que cada jogo dos anteriores utilizava uma engine diferente, na verdade é notório que reciclaram muitos dos recursos, em especial nas tiles que compunham as cidades e o overworld. Mas aqui já estavamos no início da década de 90 e os computadores 8bit nos quais os jogos anteriores eram baseados já estavam num declínio considerável. Então este Ultima VI é o primeiro jogo da série a ser desenvolvido de raiz para o PC, que nessa altura já começava a ser comum o uso de placas gráficas EGA ou VGA e placas de som como a AdLib ou as Roland que permitiram que os Ultimas para PC tivessem nativamente uma banda sonora, algo que os anteriores já há muito que tinham na “concorrência”. Ora isto resultou num jogo muito mais bonito, colorido e detalhado e cheio de agradáveis músicas com influências medievais, como não poderia deixar de ser. Mas continuando nos visuais, onde para além de cada NPC possuir um retrato diferente, o que sinceramente é algo que me impressiona até hoje, tem também algo que já não achei tão bom. Nos Ultima anteriores, tal como é feito em muito JRPG, a dimensão do nosso “boneco” dentro de uma cidade é completamente diferente num overworld, onde tudo à nossa volta se torna mais pequeno. Aqui não. Quer entremos numa cidade, dungeon ou overworld, não há nenhuma transição de “câmara”, mas no entanto as proporções não correspondem ao que seria esperado, com montanhas e árvores estupidamente pequenas em comparação com as casas. Mas isto é um mal menor na minha opinião. O pior é que não dá para ter uma ideia de para onde estamos a caminhar, a não ser que usemos uma gem especial que nos mostra um mapa mais detalhado e a nossa posição. Mas também estamos equipados com um colar que nos permite teletransportar para a maioria das localizações importantes sem nenhum esforço.

Gostei bastante deste Ultima VI. As suas mecânicas de jogo renovadas, que embora ainda sejam um pouco arcaicas, já se modernizaram bastante face aos jogos anteriores. A história é óptima para a época em que o jogo saiu, com algumas revelações interessantes pelo meio e este jogo surpreendeu-me principalmente pela quantidade de “coisas” que lhe conseguiram enfiar lá para dentro. Estou bastante curioso para ver o que fizeram no gigante Ultima VII, que por sua vez foi dividido em 2 jogos e duas expansões, mas primeiro vou dar uma espreitadela ao Ultima Underworld, onde o dungeon crawling na primeira pessoa marca o seu regresso a Britannia.

Ultima V: Warriors of Destiny (PC / Commodore Amiga)

Ultima VA série Ultima de Richard Garriot (ou também conhecido como Lord British) é uma das franquias seminais de todo o género dos RPGs, onde em conjunto com Wizardry influenciaram toda uma série de RPGs ocidentais não lineares que fomos vendo ao longo das décadas, mas também serviram de inspiração para criações como o Dragon Quest, que por sua vez foi evoluindo para os RPGs japoneses que temos hoje em dia. E esta é uma série vou rejogando aos poucos, sendo agora tempo de escrever algo do Ultima V: Warriors of Destiny, lançado originalmente em 1988. E tal como todos os outros Ultimas que tenho no PC, este foi também comprado numa GOG sale, em conjunto com todos os outros jogos da série excepto o Ultima Online, tendo estado a um bom preço. Para além da versão digital, comprei mais recentemente na Feira da Ladra em Lisboa a versão em caixa, formato big box com todos os livrinhos e mapa em tecido. É uma beleza! Custou-me 5€ e é a versão para Amiga, sendo virtualmente idêntica a esta, não vale a pena criar um artigo novo. Segue a foto:

Ultima V
Jogo completo com imensos livrinhos, papeizinhos, um medalhão e mapa em tecido. Bastante bonito! Versão para Amiga, embora seja practicamente idêntica à versão PC.

O Ultima IV foi um jogo muito peculiar, na medida em que não tínhamos um megavilão com planos de dominar o mundo para derrotar, mas sim era uma espécie de aventura introspectiva, onde teríamos de alcançar o estatuto de Avatar, portador de 8 virtudes e modelo de pessoa a seguir por todos os Brittanians. Essencialmente não nos podíamos portar mal, como assassinar ou roubar inocentes, como o jogo sempre permitiu. Ultima IV marcou também uma nova Era para Britannia (outrora Sosaria) e a partir desse jogo iríamos ver uma boa evolução do mesmo mundo, cidades e personagens nos jogos futuros. E neste Ultima V também encarnamos no papel de Avatar, mas tal como em todos os outros jogos o Avatar somos nós mesmos, seres terrestres absolutamente banais do século XX, que por algum motivo somos chamados por Lord British ao seu mundo e enfrentar mais alguma quest árdua. Este jogo começa da mesma forma, embora o apelo para retornarmos a Britannia não tenha partido de Lord British. Quando lá chegamos encontramos o mundo num estado bem diferente do que o deixamos, com Lord British desaparecido, Blackthorn no poder, com um regime bastante opressor, mudando as 8 Virtudes para 8 Leis bastante rigorosas. Para além do mais, Britannia foi invadida pelos Shadowlords, seres místicos malignos que nos atacam e ao nosso antigo companheiro Shamino, logo no início da aventura.

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Mais uma vez podemos interagir com qualquer NPC e falar com eles sobre variados temas.

Poderemos encontrar os nossos antigos companheiros do Ultima IV espalhados pelas várias cidades e teremos mais uma vez muita coisa para explorar. E ao contrário do que possa parecer, o nosso objectivo não é propriamente derrotar Blackthorn, mas  sim reencontrar Lord British que ele depois trata do resto. Claro que teremos alguns vilões para derrotar, como os tais Shadowlords, mas a maneira como o fazemos também é algo original. Ao longo do resto do jogo teremos de ter em atenção que somos procurados por Blackthorn devido a ser “foras da lei”, podendo ser perseguidos por certos guartas fieis ao novo regime e mais uma vez teremos de ter algum cuidado em practicar as tais boas acções de forma a não perder a nossa “Avatarhood“. Mais uma vez teremos também os spells que podem ser construídos após comprar os reagentes necessários e desta vez temos também um esquema de ciclo de dia e noite, com a visibilidade do overworld a ficar cada vez mais reduzida conforme vai anoitecendo. As dungeons continuam um misto de primeira e terceira pessoa, com os corredores a serem atravessados numa perspectiva de primeira pessoa e a salas vêem-se numa perspectiva de “overworld”, servindo para combater criaturas geralmente mais fortes, mas também resolver alguns puzzles com passagens secretas.

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Mais uma vez teremos de meditar em certos locais para recuperar a nossa Avatarhood

Graficamente este é um jogo que apesar de me parecer utilizar o mesmo motor gráfico do anterior, é um grande salto de qualidade face aos restantes. As sprites possuem mais animações, estão bem mais detalhadas e coloridas. O mesmo pode ser dito de todo o mundo envolvente, as montanhas parecem montanhas, as florestas parecem florestas e as diferentes classes estão devidamente bem representadas. Foi também feito um esforço adicional nas “cutscenes” que contam a história, agora com uma artwork bem mais trabalhada. As dungeons em primeira pessoa, ao contrário dos jogos anteriores que tinham as suas paredes e inimigos representados com gráficos vectoriais, são agora representadas com diferentes texturas, o que lhes dá logo um aspecto mais agradável. Os inimigos também vão sendo vistos com sprites detalhadas, com a perspectiva a transitar da primeira pessoa para o top-down view quando entramos na batalha propriamente dita. Infelizmente para o PC, em 1988 ainda não era assim tão comum encontrar PCs com placas de som, pelo que a música foi mais uma vez sacrificada e os efeitos sonoros são os bips habituais da PC-Speaker. Felizmente que existem patches feitos por fãs que trazem a música de outras versões para esta de DOS.

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Agora as dungeons possuem texturas, em vez de vectores.

Ultima V é mais um bom RPG. A história é cada vez um aspecto mais trabalhado e os NPCs são capazes de conversar connosco sobre muitos mais temas. A não linearidade de um mundo vasto, aliada a controlos ainda obsoletos poderão continuar a alienar jogadores de RPGs modernos, mas nada que um pequeno guia não ajude. No Ultima VI, apesar de ainda decorrer nesta “Age of Enlightnement”, foram vistas muitas mais mudanças e evoluções, mas isso ficará para um artigo próximo.