The Inquisitor (Sony Playstation 5)

Já há algum tempo que não comprava nada para uma consola recente completamente às cegas e foi o que aconteceu com este The Inquisitor, um videojogo produzido por um pequeno estúdio polaco e que foi lançado no ano passado para os sistemas de última geração. Comprei-o porque vi que era um jogo que decorria na idade média e onde encarnávamos num inquisitor que investigava os relatos de um suposto vampiro ter surgido numa cidade europeia. E como um membro da inquisição, teríamos carta branca para interrogar e torturar pessoas pelo que achei o conceito interessante e decidi arriscar. O jogo foi comprado numa promoção de black friday na Worten. Nota: todos os screenshots foram retirados da versão PC visto não ter encontrado nada decente para a PS5 sem marcas de água.

Jogo com caixa e um folheto com código para descarregar algum conteúdo bónus

A primeira coisa que me surpreendeu foi o facto deste jogo decorrer numa realidade alternativa e que vim mais tarde a saber que é baseada numa série de livros de mais um autor polaco. Basicamente imaginem que Jesus Cristo, em vez de ter morrido na cruz, se tinha libertado da mesma e liderado um exército capaz de derrubar o império Romano. Por consequência, o cristianismo desta realidade alternativa é visto como uma crença vingativa e que fomenta a retribuição violenta, ao invés da piedade, misericórdia e o “dar a outra face” do cristianismo actual. Ou seja, as moralidades deste jogo estão completamente trocadas e apesar de a inquisição que realmente existiu ter sido uma organização violenta e implacável, neste jogo têm também a moralidade do seu lado. Por exemplo, torturar um prisioneiro para interrogação aqui é visto como um acto do lado “bom” do compasso moral, o que é um conceito algo interessante e de facto ao longo do jogo iremos explorar toda uma série de mistérios e tomar certas decisões morais que poderão afectar o final que alcançamos.

Idade média, inquisição e instrumentos de tortura. Tudo normal, portanto.

Portanto, apesar do conceito interessante, em tudo o resto o jogo acaba por deixar bastante a desejar. Isto porque o jogo tenta ser bastante ambicioso e misturar vários subgéneros, resultando num jogo que tenta ser muita coisa e acaba por ser mediano em todas elas. Ao longo do jogo vamos ter uma grande cidade medieval (Koenigstein – aparentemente existe mesmo uma localidade na Alemanha com esse nome) para explorar, onde a narrativa nos vai guiando para falar com certas personagens e fazer também um pouco o trabalho de detective, visto que iremos encontrar alguns cadáveres para analisar e ocasionalmente alguns puzzles para resolver como um jogo de aventura se tratasse. Ao pressionar os botões L2+R2 o inquisidor começa a rezar e activa uma visão especial, com todo o ecrã a ficar escuro e os pontos de interesse à nossa volta sobressaem com um relevo brilhante, ou a direcção geral do próximo objectivo, o que simplifica bastante a parte de aventura pois sabemos sempre onde temos de ir a seguir. Fora isso temos também uma componente de acção com vários combates de capa e espada, onde o sistema de combate não é fantástico. Para além disso, ocasionalmente visitamos uma outra dimensão, o Unworld, em busca de respostas. Aqui o jogo assume-se quase como um soulslike, pois o objectivo é o de explorar uma espécie de labirinto onde poderemos combater (ou evitar) criaturas estranhas e se morrermos em combate ou exploração voltamos ao último “poço de luz” que tenhamos desbloqueado.

Ocasionalmente, tal como nos Assassin’s Creed, também temos de ouvir conversas alheias à distância

No entanto como referi acima, as mecânicas de jogo não estão muito refinadas, pois apesar das primeiras vezes em que entrei no Unworld terem sido tensas, rapidamente apercebi-me que poderia simplesmente correr de um lado para o outro e evitar a maior parte dos combates. Aliás, o jogo não tem qualquer nível de dificuldade para se seleccionar, mas nas opções podemos simplificar os combates para que todos os oponentes morram com um só golpe, evitar QTEs ou até fazer bypass dos vários puzzles. Será que a Dust sabia que o seu jogo não era grande coisa e quiseram dar essas opções a quem quis evitar frustrações? O jogo tem também um sistema de autosave, mas os checkpoints nem sempre são muito generosos. Para além disso, aconteceu-me várias vezes ter ficado preso nos cenários o que me obrigou a desligar o jogo e voltar ao último checkpoint, que como já referi acima, nem sempre grava nas alturas ideais.

De vez em quando temos de explorar uma realidade alternativa em busca de respostas. Infelizmente é mais uma ideia interessante mas mal executada.

A nível audiovisual e técnico, este também é um jogo bastante inconsistente. Os cenários estão bem detalhados, não é nada de absolutamente incrível mas a cidade está bem coerente, com os seus 5 distritos bastante distintos entre si e consideravelmente bem detalhados. O mesmo não pode ser dito das personagens, infelizmente, pois estas estão muito mal detalhadas, quer nas personagens principais, quer nos NPCs com os quais nos iremos cruzar. Não estou a brincar, pelo menos a nível de detalhe e animação facial, há jogos de PS2 com personagens melhores renderizadas. Quebras de framerate também foram constantes e notórias e a banda sonora é composta principalmente por músicas ambientais que sinceramente não me ficaram na memória. O voice acting é também algo inconsistente, pois temos personagens melhor interpretadas do que outras.

Como em vários outros jogos de aventura, ocasionalmente temos puzzles para resolver. No entanto, apesar deste screenshot ser oficial (está na página de venda no steam), este puzzle em específico não me passou pelas mãos. Ou foi retirado do lançamento final, ou de facto as decisões que tomamos importam e podem-nos levar por caminhos bem diferentes.

Portanto este The Inquisitor é um jogo interessante pelo seu conceito, mas é também um jogo que apenas recomendo se forem fãs de jogos que decorram na idade média com toda a sua violência e podridão inerente. Pois de resto, quer a nível de mecânicas de jogo, quer a nível audiovisual e de performance, o jogo deixa algo a desejar. Gastei cerca de 25€ com ele visto ser ainda um jogo algo recente mas sinceramente preferia ter gasto metade disso.

Anna Extended Edition (PC)

De volta aos jogos digitais para PC, com um artigo sobre o Anna e a sua Extended Edition. Anna é um jogo interessante, na medida em que mistura o terror, com uma perspectiva de exploração em primeira pessoa, e uma jogabilidade repleta de puzzles ao velho estilo do point-and-click. Infelizmente a sua execução é que não é a melhor, conforme irei explicar mais à frente. Esta edição do jogo é a Extended Edition, que inclui uma série de novos puzzles, vários finais novos e algum conteúdo bónus como a banda sonora do jogo, e algumas fotos, artwork e scans. Este jogo entrou na minha colecção steam por intermédio de um sorteio no NeoGAF, apesar de também existir em formato físico se procurar bem.

Anna Extended EditionA história começa quando nós, o jogador, se depara em frente a uma casa/moinho decrépito em plenos Alpes italianos, numa paisagem idílica. A personagem sofre de amnésia (o que começa a ficar cliché em jogos de terror), e sente um chamamento intenso de uma misteriosa Anna que o chama a explorar a tal casa em ruínas. A Extended Edition incluiu um notebook onde a personagem escreve as suas interpretações dos acontecimentos que vão decorrer ao longo do jogo, tendo já algumas páginas com background escrito, sobre divindades pagãs e rituais antigos essencialmente. E a história do jogo vai sendo essa, à medida em que vamos progredindo no jogo a personagem irá-se lembrar cada vez mais das suas memórias perdidas e novos detalhes sobre Anna, vão sendo descobertos. O jogo tem uma história repleta de esoterismo e mistério sobre Anna que nunca chegamos realmente a descobrir quem ou o que é, mas vamos descobrindo vários livros que contam lendas ancestrais e também rituais pagãos que sinceramente me despertaram o interesse. A parte interessante da história é que a mesma é baseada em folclore local, bem como a própria casa/moinho abandonado existe mesmo na vida real e foi alvo de um assassinato por parte de um lenhador que matou toda a sua família. Fotos das ruínas existem no conteúdo bónus.

screenshot
Vista de fora, com um sol maravilhoso, a casa até é acolhedora, apesar de estar em ruínas.

Apesar de ser um jogo de exploração livre na primeira pessoa, a jogabilidade é essencialmente a mesma de um jogo de aventura point and click, na medida em que vamos explorando os vários recantos da casa, coleccionando objectos que podem ser misturados entre si e interagidos com o cenário para resolver os puzzles que nos são apresentados. Contudo os puzzles não são fáceis de se desmistificar, não existe uma linha condutora que nos dê uma ideia do que fazer a seguir, pelo que ler as notas que a personagem principal vai escrevendo no seu bloco de notas ou lendo os livros que vamos descobrindo são as únicas pistas que vamos tendo. Isto porque muitos dos puzzles apresentados são apenas representações dos vários rituais mágicos que vamos lendo nos contos encontrados. Infelizmente os menus do inventário também são um pouco confusos e bugged, aconteceu-me várias vezes não conseguir visualizar todos os items e livros que tinha no inventário, pois as “setas” que servem para navegar no menu não respondiam.

screenshot
Estas estátuas e manequins de madeira vão sendo uma constante ao longo do jogo.

Mas ao contrário de muitos outros jogos de aventura, este Anna não é propriamente um jogo a que nos podemos dar ao luxo de levar imenso tempo com tentativa/erro para resolver os puzzles. E é aqui que entra o elemento de terror. Ao longo do jogo vamos observando de forma algo aleatória diversos eventos assustadores e alucinações que nos vão diminuindo a nossa sanidade mental, quando a sanidade se reduz a zero é game-over. No entanto, para o jogador regenerar alguma da sanidade mental deve progredir no jogo, ao resolver puzzles e alcançar novas áreas/divisões da casa, muitas vezes acompanhadas por outras visões ou eventos assustadores. Existe uma divisão em específico que é bastante prolífera de alucinações “malignas”, pelo que é sempre bom manter em uso o sistema livre de save game com vários saves ao mesmo tempo. Originalmente existiam apenas 3 finais disponíveis, já esta Extended Edition aumentou os mesmos para 8. O engraçado é que quanto mais avançamos na história e descobrimos o nosso passado e a Anna, mais macabro é o final. Com esta nova leva de finais existem vários a alcançar ainda pouco depois de se ter entrado na casa e não se ter desvendado practicamente nada.

screenshot
Exemplo de uma das cenas perturbadoras que acontecem algo aleatóriamente

Graficamente o jogo tem uns visuais muito bonitos, embora não seja um jogo que esteja muito bem optimizado para diferentes PCs. Apesar de ter máquina suficiente para jogar em full HD e com tudo no máximo, o jogo ficava com um framerate impraticável, tendo de diminuir na qualidade gráfica depois. Mas ainda assim não deixava de ser um jogo com uns gráficos bastante interessantes, principalmente pelas várias mutações fantasmagóricas e respectivos efeitos de luzes que a casa ia sofrendo com o jogo. Essas foram muito bem implementadas e davam realmente um aspecto sinistro ao jogo. O mesmo pode ser dito para as várias estátuas que nos vão aparecendo ao longo da aventura, assim como outros objectos e silhuetas macabras. A contrastar com uns visuais assombrosos está uma banda sonora incrivelmente calma. A maior parte das músicas são belas melodias acústicas de piano e guitarra. Outras já são mais de rock/metal, tendo sido compostas pela banda italiana de gothic metal Chantry e tocam nos vários ecrãs de gameover e créditos. Como apreciador de metal que sou, devo dizer que não conhecia a banda de lado nenhum e infelizmente fiquei sem vontade de conhecer mais, pois a vocalista francamente deixa muito a desejar. Instrumentalmente são bons, mas isso não chega. Mas esta análise não é uma crítica à banda, mas sim ao jogo cujas músicas me parecem muito desapropriadas à atmosfera que tentam criar.

screenshot
Gostei bastante da interpretação que deram a estas máscaras, quando o jogador tem de as colocar em si mesmo

Posto isto acho Anna um jogo que teria potencial para ser muito melhor do que o que saiu. Mesmo a versão Extended Edition com todo o seu conteúdo adicional, faz com que o jogo pareça algo inacabado e pouco polido. A história repleta de esoterismo com imensos rituais antigos que atravessam diferentes eras é algo que eu tenho um particular interesse, mas não foi de todo bem aproveitada. O mesmo é válido para a jogabilidade e respectivos puzzles, que deveriam ser um pouco mais “afinados”. Ainda assim não deixa de ser um jogo minimamente interessante, para os que gostam de aventuras de terror. Fica o convite para o experimentarem. À hora que estou a escrever este artigo, faltam pouco mais de 17 horas paar terminar o Humble Weekly Sale Kalypso Media, onde o jogo está a um preço irrisório, acompanhado por outros bons jogos.