É tempo de regressar à Playstation 2 com um jogo de acção que há muito me despertava curiosidade: Gungrave: Overdose. O primeiro Gungrave surpreendeu-me pela positiva, sobretudo pelo seu conceito e mecânicas de jogo originais. Ainda assim, havia bastante margem para melhorar certos aspectos menos conseguidos, o que me deixou curioso quanto às eventuais melhorias introduzidas na sequela. Ambos os títulos foram desenvolvidos pela Red Entertainment. O primeiro jogo foi publicado na América do Norte pela Sega, enquanto por cá ficou a cargo da não menos sonante Activision. Recordo-me bem de ver gameplay desse primeiro título com alguma frequência em canais de televisão por satélite dedicados a videojogos, reflexo de uma boa campanha de marketing. Já a sequela, lançada dois anos mais tarde, não teve a mesma sorte. Nas Américas, foi distribuída pela desconhecida Mastiff, nome do qual nunca ouvira falar, e que, após uma breve pesquisa pelo seu reportório, percebi porquê. A Europa só viria a receber esta sequela em 2005, cortesia da Play It, uma editora também especializada em títulos budget. Apesar do shovelware com que frequentemente nos brindavam, também nos trouxeram alguns lançamentos nipónicos interessantes, como Castle Shikigami 2, 1945 I&II ou, pasme-se, Guncom 2. O meu exemplar foi comprado a um particular na Vinted, algures em Janeiro deste ano, por cerca de 15€.
As mecânicas base do Gungrave original estão todas de regresso. Controlamos Beyond the Grave, um cyborg reanimado após ter sido assassinado, um pistoleiro silencioso, munido de duas armas imponentes e um enorme caixão às costas. Trata-se essencialmente de um shooter na terceira pessoa, em que o botão quadrado serve para disparar, o círculo para ataques corpo-a-corpo e o X para saltar. Uma das melhorias desta sequela é o facto de podermos disparar enquanto nos movemos, embora o ritmo de disparo seja mais rápido se estivermos parados ou, melhor ainda, durante os saltos. O botão L1 permite trancar a mira no inimigo mais próximo, e, caso não esteja activa, possibilita o movimento lateral. Com o L2, executamos uma volta de 180º, bastante mais eficiente do que rodar manualmente a personagem. Já o R1 alterna a mira entre inimigos, enquanto o R2 acciona uma pose espalhafatosa cuja utilidade, sinceramente, me escapou. Outra novidade nos controlos é o uso do analógico direito para mover a câmara. Contudo, a implementação está longe de ser ideal, sobretudo porque o sistema de lock-on também deixa a desejar. De pouco me serve virar a câmara se Grave continua virado noutra direcção, e ao pressionar o botão de mira automática, a mira prende-se no inimigo que estiver no seu ângulo, não necessariamente aquele que estou a tentar focar.

No essencial, a jogabilidade mantém-se bastante próxima da prequela, encorajando-nos a executar combos com números impressionantes (frequentemente na casa das centenas). Tal deve-se não só ao grande número de inimigos por nível, mas também à quantidade de elementos destrutíveis nos cenários, que contam igualmente para o combo. Estes combos enchem a barra de munição para os demolition shots, ataques especiais bastante poderosos que, tal como no primeiro jogo, são activados com o botão triângulo. À medida que avançamos e dependendo da nossa performance em cada nível, vamos desbloqueando novos demolition shots, que podem ser seleccionados a qualquer momento através do botão direccional. Grave possui duas barras de energia: uma de escudo e outra de vida. O escudo regenera-se automaticamente se nos mantivermos fora de combate durante algum tempo. Quando este se esgota, passamos a perder vida, mas também é possível recuperá-la. Para isso, devemos utilizar os demolition shots de forma estratégica, pois quanto mais dano causarem, mais vida conseguimos recuperar. O jogo convida, assim, a um delicado equilíbrio entre risco e recompensa, introduzindo um elemento táctico que torna os tiroteios mais interessantes.
Relativamente cedo no jogo, conheceremos duas novas personagens que nos acompanharão ao longo da aventura: Billy e Juji, ambos também cyborgs reanimados. A partir do momento em que os encontramos, tornam-se seleccionáveis para jogarmos com eles numa nova partida. Experimentei brevemente ambas as personagens, apenas para ter uma ideia de como se comportam em acção: as mecânicas base mantêm-se, mas cada um possui armas e demolition shots distintos. Billy é um guitarrista cuja guitarra eléctrica dispara raios de energia de longo alcance, embora os seus ataques corpo-a-corpo sejam relativamente fracos. Juji, pelo contrário, empunha um híbrido entre espadas e armas de fogo, bastante mais eficaz nos confrontos próximos. O facto de Gungrave: Overdose ser significativamente mais longo do que o primeiro jogo, aliado à possibilidade de desbloquear e jogar com estas duas personagens adicionais, contribui de forma bastante positiva para a sua longevidade!

A nível audiovisual, confesso que este jogo me deixou um pouco desapontado. Tal como no original, há um estilo visual bastante icónico no design das personagens e de alguns inimigos, o que não surpreende tendo em conta a colaboração de artistas reconhecidos do mundo manga e anime no desenvolvimento visual. Ocasionalmente, temos direito a algumas cenas em anime que ajudam a avançar a história, embora a maioria das sequências se limite a retratos estáticos das personagens envolvidas, o que retira algum dinamismo à narrativa. No que toca ao grafismo propriamente dito, o jogo deixa algo a desejar nesse aspecto. O jogo mantém um certo nível de cel-shading tal como no primeiro jogo, mas não houve grande evolução ali. A banda sonora também me passou praticamente despercebida, abafada pelo constante ruído dos tiroteios, embora por vezes se ouça uma ou outra faixa com influências jazz, sobretudo durante as cenas mencionadas acima. O voice acting sinceramente não achei nada de especial, tendo sido infelizmente dobrado em inglês, ao contrário da prequela que se manteve em japonês. Por fim, não posso deixar de referir um detalhe curioso desta versão europeia: por alguma razão, a editora Play It optou por utilizar a infame Comic Sans como tipo de letra para todos os diálogos, uma escolha questionável, tanto mais que a versão norte-americana recorre a uma fonte bem mais convencional.
Gungrave: Overdose deixa-me com sentimentos algo mistos. Apesar de apresentar melhorias na jogabilidade, como o controlo da câmara, uma duração mais prolongada e personagens desbloqueáveis, continuam a existir limitações nos controlos, especialmente no mecanismo de lock-on, que pode gerar frustração em várias situações. Visualmente, diria até que o Gungrave original teve mais impacto pela sua estética ousada, enquanto este parece ficar um ou dois degraus abaixo. Ainda assim, o jogo tem uma boa dose de momentos intensos e satisfatórios, especialmente para quem aprecia jogos de acção de ritmo elevado. Percebe-se, contudo, porque acabou por ser lançado a um preço económico. Após este título, a série Gungrave ficou em pausa durante vários anos, regressando apenas em 2018 com um jogo concebido para VR, que eu não cheguei a experimentar, nem conto em fazê-lo. Em 2022 surgiu uma nova sequela, Gungrave G.O.R.E, que também não foi particularmente bem recebida. Curiosamente, acabei por comprar a versão PS5 desse título, e conto jogá-lo em breve.
























