Bom, o artigo de hoje vai ser uma espécie de excepção. Durante muito tempo, seja em viagens em transportes públicos ou as regulares viagens Porto-Lisboa que fiz enquanto lá trabalhei/vivi, joguei muita coisa tanto do catálogo da Nintendo DS, como da PSP. No caso da DS, desde cedo que tive acesso a um flashcart que me permitiu simplesmente jogar lá o que me desse na gana, sendo que acabei por jogar muitos dos RPGs de ambos os sistemas. Entretanto, quando comecei a ter possibilidades para começar mais a sério a minha colecção, tenho tentado sempre comprar todos os jogos que havia pirateado antes, sendo que actualmente sobram menos de uma mão cheia de jogos da DS que joguei mas ainda não comprei. Infelizmente alguns desses títulos são obscenamente caros e sinceramente nem eram assim tão bons quanto isso, pelo que provavelmente esses nunca cá entrarão na colecção. Este Final Fantasy: The 4 Heroes of Light é um dos casos de um jogo que já tinha jogado e terminado há bastantes anos atrás, mas apenas consegui comprar um exemplar para a colecção algures em 2022. Quando compro jogos que já havia jogado antes “por outros meios”, faço sempre questão de os jogar novamente antes de escrever algo sobre eles e o mesmo acontece no caso dos RPGs, como foi o caso do Chrono Trigger, Shining Force(s), Tales of Phantasia, Breath of Fire, entre muitos outros. Mas actualmente o meu tempo livre não tem sido assim tanto quanto isso e este é um RPG que não me deixou uma boa impressão quando o joguei. Pelo que desta vez abri uma excepção e decidi não o voltar a jogar, tendo no entanto visto ocasionalmente algumas horas de gameplay para reavivar a memória. E este não será o último RPG onde irei aplicar este princípio, mas isso ficará para depois.
Este jogo, lançado entre 2009 e 2010 foi desenvolvido como um spin-off da série Final Fantasy e que de certa forma tenta reviver alguns dos conceitos dos primeiros jogos da aclamada série de RPG da Square. Este foi então desenvolvido pela Matrix Software, empresa que não era estranha em RPGs, pois foram os autores de ambos os Alundras, alguns spinoffs da série Dragon Quest e foram também a empresa responsável pelos remakes da Nintendo DS do Final Fantasy III, Final Fantasy IV (outro dos que também joguei na DS mas ainda não arranjei), assim como a sequela Final Fantasy IV: The After Years, que ficou também disponível na compilação Final Fantasy IV: The Complete Collection. As inspirações aos Final Fantasy clássicos são bem notórias a começar pelo facto de termos cristais mágicos que nos vão dando alguns concelhos para progredir na história, assim como o facto de controlarmos 4 personagens principais e ainda a variante do job system aqui implementada.

A aventura começa connosco a encarnar no papel de Brandt, um jovem que faz 14 anos e que recebe do seu rei a missão de resgatar a sua filha, a jovem princesa Aire, que havia sido feita prisioneira de uma bruxa. A Brandt juntam-se o seu amigo Jusqua e Yunita, a guarda-costas da princesa. Juntos salvam Aire que se junta ao nosso grupo, mas ao regressar a casa, encontram todos os seus habitantes transformados em estátuas como uma maldição da bruxa que tinham acabado de derrotar. O grupo decide então partir à aventura em terras vizinhas em busca de salvarem a população da sua terra natal, mas naturalmente que irão encontrar mais problemas. Uma das coisas que este Final Fantasy retira de alguns dos seus predecessores (como é o caso do FF VI), é o facto de as personagens principais constantemente seguirem caminhos separados e conhecerem outros protagonistas, com a narrativa a alternar regularmente entre o que cada personagem estará a fazer naquele momento. Eu diria que a primeira metade do jogo é toda passada desta forma, com a última metade a “trancar” as personagens jogáveis para as 4 personagens principais que referi acima.

No que diz respeito à jogabilidade, numa análise mais superficial esta é muito similar aos Final Fantasy da velha guarda, com combates aleatórios e por turnos (nada de ATB aqui) e onde no fim dos mesmos vamos ganhando dinheiro e experiência. Existem no entanto muitas nuances a ter em conta, a começar pelos AP (action points). Cada personagem jogável tem 5 APs disponíveis para desencadear acções como atacar ou utilizar outras habilidades, sendo que diferentes acções poderão consumir mais ou menos APs. No final de cada turno recuperamos um desses pontos, existindo no entanto uma acção própria para recuperar mais APs. Mas como devem calcular, isso significa também sacrificar um turno. Para além disso, o espaço de inventário é bastante reduzido, sendo que cada personagem pode carregar até 15 itens. Tendo em conta que iremos passar muito do tempo sozinhos ou com uma party de 2 personagens, assim como ser apenas possivel gravar o progresso do jogo em certos pontos próprios, o jogo irá então nos obrigar a fazer um planeamento bastante cuidado sobre que itens levar em cada incursão a uma nova dungeon, já para não falar em como planear cada combate devido ao número reduzido de APs disponíveis e também do inventário. A gestão de inventário pode e deve também ser feita utilizando lojas próprias para o efeito, que nos permitem guardar itens e equipamento que poderão ser levantados mais tarde.
O job system é também algo de especial relevância, pois os jobs neste jogo estão intrinsecamente ligados a chapéus, aqui carinhosamente apelidados de coroas. À medida que vamos avançando na história, iremos desbloquear novos chapéus que por sua vez, uma vez equipados, conferem novas habilidades às personagens. White Mage, Black Mage ou Fighter são apenas alguns dos exemplos de chapéus que podem ser desbloqueados e equipados, cada um com características e habilidades próprias. Para além disso, os chapéus podem ainda ser customizados, equipando-os com diversas pedras preciosas que vamos também ganhando com os combates. Portanto, devido a todas estas mecânicas de jogo, o inventário reduzido, os action point reduzidos e todas as customizações possíveis no job system, tornam este jogo bastante estratégico e desafiante, o que contrasta imenso com os seus visuais que já me focarei em seguida. De resto, convém só mesmo mencionar que o jogo possui também um modo multiplayer cooperativo, cujos pontos obtidos podem também serem utilizados em certas lojas para comprar equipamento.
A nível visual este é um jogo muito bonito. Creio que partilha do mesmo motor gráfico introduzido no remake do Final Fantasy III, o que permite à Nintendo DS apresentar gráficos 3D com um nível de detalhe algo acima da média do que a plataforma nos habituou. Mas é mesmo a arte mais minimalista e quase vinda de um livro de contos infantis que acaba por resultar tão bem. Aldeias como a de Horne, Guera ou Arbor são tão distintas entre si mas com um detalhe artístico muito único e que sinceramente resulta bastante bem. As personagens são as típicas personagens cabeçudas que os japoneses tanto gostam, mas também refletem todo o equipamento equipado, incluindo os seus chapéus/coroas. Pena no entanto pela “reciclagem” de dungeons, visto que uma boa parte da segunda metade do jogo nos obriga a revisitá-las todas. De resto, as músicas vão sendo também bastante agradáveis no geral e os efeitos sonoros cumprem bem o seu papel. A narrativa é no entanto bastante simples e diria mesmo até algo infantil, o que, em conjunto com os seus visuais, contrasta bastante com a dificuldade elevada imposta por todas as mecânicas de jogo e suas restrições.
Portanto este Final Fantasy: The 4 Heroes of Light foi para mim uma experiência algo agridoce, pois por um lado adorei a parte estética e artística do jogo, levando-nos a crer que estaríamos perante um título mais relaxado e até mais casual, o que não seriam necessariamente más notícias visto que hoje em dia somos todos adultos ocupados e de vez em quando sabe bem jogar algo mais relaxante. Mas as mecânicas de jogo aqui implementadas tiram-nos todo esse tapete reconfortante, obrigando-nos mesmo a aprender a tirar partido do job system que aqui implementaram e que até tem algumas boas ideias. Não gostei no entanto no número muito reduzido de APs, inventário e narrativa bastante simples. Muitas das mecânicas aqui apresentadas foram no entanto aprimoradas no Bravely Default, jogo que muitos fãs de RPGs que eu conheço veneram. A ver se o jogo em breve!









